sábado, setembro 30, 2006

Momentos Kodak (20)

Para quem quiser adivinhar, deixo umas dicas. Fica em Lisboa, já nem sei quando começou a ser construído, não se sabe quando fica pronto e está tudo à espera para perceber se realmente é útil ou não à cidade.
(Setembro 2006)
Foto: Rodrigo Cabrita

Confissões de um fura-greves

O procurador-geral da República cessante, Souto Moura, dá à edição de hoje da revista Tabu, publicada com o semanário Sol, uma entrevista que é muito esclarecedora sobre a sua personalidade. Justificando o facto de em 1969 ter "furado" uma greve universitária em Coimbra, quando frequentava a Faculdade de Direito, Souto Moura fornece o pior dos argumentos: não agiu assim por convicção, o que seria discutível, mas por mera conveniência, o que é inaceitável. Na idade de todos os idealismos, já se comportava deste modo: "A minha preocupação principal era não chumbar o ano." Palavras dele próprio, para que não haja equívocos. Fica tudo dito sobre a personagem...

A esquerda mais exótica da Europa

Sem menosprezo para o "bate-papo" de Ana Paula Azevedo e Vítor Rainho com Souto Moura, a melhor entrevista desta edição do Sol é com o escritor chileno Luis Sepúlveda, grande amigo de Portugal. Gosto dos livros dele e discordo de muitas das suas ideias políticas - a começar pelo incondicional apoio que tem dado à ditadura cubana. Mas, em resposta às perguntas da jornalista Maria Francisca Seabra, Sepúlveda faz uma das melhores caracterizações que já vi até hoje da esquerda portuguesa, considerando-a "a mais exótica da Europa". E justifica porquê: "São apenas dois e a cada meia hora dividem-se! Portugal é um país de barões políticos. Qualquer pessoa de esquerda que ache que tem pedigree sente-se moralmente autorizada para ser um líder."

Frases do "Sol"

"Quantos de nós conhecemos homens de 40, 50 e até de 60 anos que acabam com casamentos de décadas por um par de mamas de uma lambisgóia com metade da idade deles?"
Margarida Rebelo Pinto

"Uma mulher desmazelada não serve para nada."
Maria José Nogueira Pinto

"Muitos gostam os portugueses - e eu não sou excepção - de temas como gravidezes, bebés e dramas domésticos."
Marcelo Rebelo de Sousa

"Não me lembro, em toda a minha vida, de ter visto um episódio sequer de uma telenovela, portuguesa ou brasileira, do princípio ao fim."
António-Pedro Vasconcelos

"As insónias são criativas."
Vasco Graça Moura

Espelho meu...

Tenho sangue de barata, sou um resistente. Sou monárquico, do Sporting, conservador, de direita (com as letras todas), casado e católico praticante. Habituado a duras batalhas, sempre com fé, sempre empenhado. Habituado a levar muita porrada, sim!
Mas agora é demais: chegado à charmosa idade dos 45 anos, com as minhas respeitáveis entradas, cabelos grisalhos e apurada sabedoria, no auge do meu convencimento, sou surpreendido pela insolente Margarida Rebelo Pinto. Afirma ela na sua catedrática e sexy coluna do Sol, que afinal as mulheres da moda, modernas, maduras e inteligentes, provavelmente as que contam, hoje em dia preferem os rapazes mais novos. Agora deu-lhes para isso… Diz que têm mais graça sem traumas e descomplexados… que são uma fonte inesgotável de… Arghh! Não sei se aguento mais esta contrariedade.
O que me vale é que sou monárquico, do Sporting, conservador, de direita, casado e católico praticante!

Cavaco valoriza 5 de Outubro*

Parece-me natural… Lá diz o povo: “Não mordas a mão a quem te dá de comer.”

* Titulo de capa do Sol sobre as iniciativas para a efeméride

Critérios editoriais

No dia 27 de Abril de 1937, o repórter britânico John Steer visitou, horrorizado, as ruínas ainda fumegantes da histórica cidade basca de Guernica, barbaramente destruída pela aviação nazi, aliada das forças falangistas de Franco. Em poucos minutos, com a sua máquina de escrever portátil, redigiu aquele que viria a ser o mais célebre despacho da Guerra Civil de Espanha - o texto que revelou ao Mundo um dos piores massacres de civis registados no século XX. "Às duas da manhã de hoje, quando visitei a cidade, esta oferecia uma visão horrorosa e ardia de lés a lés", relatava o jornalista.
A prosa de Steer foi de imediato enviada por telefone para Londres e Nova Iorque, onde viria a ser publicada nas edições da manhã seguinte. Mas os critérios editoriais adoptados nas duas margens do Atlântico foram antagónicos: o Times londrino escondeu a notícia numa página interior, sem chamada de capa; o New York Times publicou-a em manchete. O jornal americano assumiu a decisão correcta, conseguindo um scoop à escala planetária. O diário britânico, pelo contrário, inutilizou uma das matérias mais relevantes de todos os tempos por incapacidade técnica ou manipulação política.
Esta é um dos muitos episódios relacionados com a cobertura jornalística do sangrento conflito de 1936-39 que podemos encontrar na exposição Correspondentes da Guerra Civil de Espanha, no Instituto Cervantes, em Lisboa. Uma exposição que bem merece ser visitada por todos os leitores de jornais. Ficamos a perceber melhor que os duvidosos critérios editoriais dos nossos dias têm antecedentes remotos - alguns dos quais tristemente célebres, como o do Times que escondeu a notícia do massacre de Guernica.

sexta-feira, setembro 29, 2006

História de algibeira (5)

No dia de Natal de 1903 Raul Brandão publica no jornal “O Dia” uma comovedora reportagem sobre uma visita da Rainha D. Amélia às pobres crianças tuberculosas internadas no Dispensário de Alcântara. O evento terá marcado por certo a miudagem delirante. A ceia compôs-se de “Canja, Peru corado, fruta e bolos”. Raul Brandão, às tantas descreve o diálogo entre a Rainha e um residente de 5 anos durante a distribuição dos presentes:
“- Que queres tu? – pergunta Sua Majestade”
“- Um cavalo – replica imediatamente o bambino indócil”
“- Isso é difícil, mas vamos lá procurá-lo”

Lá se descobre um "por entre um turbilhão de mil fantasias de folha colorida”. Por fim Sua Majestade entrega-o ao “pequenote. E ele vai, sobraçando o brinde, rindo, numa correria de gamo perseguido”.

Fonte e citações: Raul Brandão – Paisagens com Figuras. Inéditos 1887-1930
Organização Vasco Rosa - Âmbar 2006

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Um herói do século XX

É um acontecimento editorial, com repercussão simultânea em diversos países – incluindo Portugal. Mandela – O Retrato Autorizado, álbum que reúne uma vasta colecção de fotografias de Nelson Mandela e cerca de 60 depoimentos sobre o ex-presidente da África do Sul, terá lançamento à escala internacional na próxima segunda-feira (em Lisboa, no Corte Inglés, às 18.30 desse dia). Uma obra que consagra Mandela como um dos maiores políticos do século XX, autêntica lenda vida do nosso tempo. No prefácio, Kofi Annan diz tudo nesta frase: “Se estivermos à altura de uma pequena parte do que Mandela é, o mundo será um lugar melhor.” E o ex-presidente americano Bill Clinton, num comovido testemunho, acrescenta: “O que torna Mandela tão especial é o facto de ser um verdadeiro ser humano. Ri, chora, enfurece-se, apaixonou-se por Graça Machel. Tem uma vida a sério. E o facto de ser tão verdadeiro, tão real, torna a sua grandeza, o seu sacrifício, a sua sabedoria e a sua coragem face a tudo aquilo que lhe aconteceu ainda mais extraordinário.”
Mandela – O Retrato Autorizado tem chancela portuguesa da editora Quidnovi e tradução de Jorge Almeida e Pinho.

Para apurar o nosso grau de beleza


Só regresso algures para a semana. Tenho o cérebro em pousio que é como quem diz em intervalo. Depois virá esse dia de acender a lareira com a lenha guardada dos dias anteriores e de cozinhar o que levedado resistiu e cresceu (se crescer) apesar da humidade das noites.
Não consigo escrever até lá, mas consigo ler e ver a beleza aliás indisfarçável que existe em lugares como este. Aqui, onde a Alice habita e a Lebre espreita, com os olhos sempre muito abertos às maravilhas subtis para muitos invisíveis e para outros luminosas, de tão evidentes. Vão lá se quiserem, mas não profanem a melancólica inocência do lugar. É só o que vos peço. Obrigado.

O "mercado"

A propósito daquilo que eu e o Pedro aqui temos escrito sobre o aparecimento de novos títulos, a concorrência e o "esticar" das audiências (dos jornais, não dos blogues), chamaram-me à atenção para o que João Marcelino, director do Correio da Manhã, escreveu na edição da semana passada da Sábado: "Quando as empresas jornalísticas são criativas, os nomes inspiram confiança e sobretudo a informação é de qualidade, as pessoas interessam-se e aderem. Nunca se leu tanto em Portugal, entre jornais e revistas, e isso pode ser demonstrado com números. A crise existe? Existe, claro. Mas nos títulos do costume, desculpada por palavras mágicas como 'mercado' e por razões que só um cego não vê".
Uma reflexão que, confesso, me tinha escapado, mas que aqui deixo na véspera de mais um fim de semana de "guerra" entre o Expresso e o Sol. Para já, ambos garantem querer manter os 410 mil exemplares de tiragem que somam juntos.

Friday






















Kerry McGregor.

Apetece-me ridicularizar...

Já aqui se brincou com o Bush.
Está na altura de gozar com os terroristas.

Iniciativa privada

Esta manhã, o engraxador brasileiro que costuma exercer o ofício na esquina da Duque de Loulé com a Barata Salgueiro estava na esquina oposta. Vendendo guarda-chuvas a quem passava.

A Marca do coração

Eu trabalho (com entusiasmo) para uma grande “marca” nacional. Esta empresa foi fundada nos anos 30 pelos senhores Cardoso e Machaz, dois irredutíveis beirões, que com a sua coragem, esforço e empreendedorismo granjearam ao seu projecto uma inegável reputação internacional, hoje símbolo de uma “escola” e “produto” de sucesso em Portugal.
Agora, já não gosto da ideia de chamar “marca” a um clube de futebol. Eu percebo a ideia, e porventura é até bem razoável. Mas não gosto, não fica bem; é uma questão estética.
A relação de um adepto com um clube de futebol é normalmente um razoado de afectos, que atribuem um estatuto quase místico ao seu clube de eleição. Assim, com esse toque de mágica, o espectáculo de 25 galfarros atrás de uma bola, com meia dúzia de tácticas e regras mais ou menos básicas, ganha um sentido quase superior. Um clube de futebol não é com toda a certeza uma entidade metafísica. Mas é uma paixão, uma ilusão benigna, não compatível com os conceitos materialistas e empresariais de Marca, Produto. Que os clubes sejam geridos como empresas, com competência e racionalidade, rumo ao sucesso, claro que sim!
Mas nessa relação única de adepto, não nos matem o sonho. O meu clube não é uma marca. É o Sporting.

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Momentos Kodak (19)

Para descansar a vista...
Paisagem em Vila Velha de Ródão
(Julho 2006)
Foto: Rodrigo Cabrita

Gostei de ler

1. Tempos interessantes. De Pedro Mexia, no Estado Civil.
2. Novidades? De João Gonçalves, no Portugal dos Pequeninos.
3. Notícias do medo. De Jorge Ferreira, no Tomar Partido.
4. A ver se nos entendemos. De Tiago Barbosa Ribeiro, no Kontratempos.
5. Uma ópera responsável. De Luís Januário, n'A Natureza do Mal.
6. Da leitura. De Tiago Galvão, no Diário.
7. Livros malditos: no inferno das bibliotecas. De Miguel Castelo-Branco, no Combustões.

quinta-feira, setembro 28, 2006

Cavaco: as coisas são o que são

Tomás Vasques e Jorge Ferreira reagiram, nos respectivos blogues, às reflexões que aqui deixei a propósito das relações entre Cavaco Silva e a direita que esperava dele a condução das acções de oposição ao Governo socialista.
O que escreveram suscita-me os seguintes comentários:
1. Estamos de acordo no essencial, caro Tomás. Não faço, no entanto, uma leitura tão tacticista dos supostos desígnios de Cavaco Silva. Desde logo porque, como já anotei no Corta-Fitas, não creio que o actual Presidente ambicione um segundo mandato, introduzindo assim uma inovação nos nossos hábitos políticos. Também me parece evidente que Cavaco "não acredita nos méritos governativos da actual direcção do PSD", o que ajuda a reforçar a boa relação institucional que estabeleceu com José Sócrates. Falta sublinhar um aspecto que não mencionei anteriormente: Cavaco revê-se no perfil psicológico de Sócrates, sem dúvida semelhante ao seu em aspectos decisivos. Às vezes estes pormenores ajudam a explicar melhor determinados comportamentos do que as mais elaboradas análises políticas. A muitos que votaram nele, pensando que de Belém partiriam os disparos decisivos contra o estado-maior socialista, estes primeiros seis meses de mandato só podem ter sido frustrantes. Pois é: o tiro saiu-lhes pela culatra.
2. Naturalmente, "o facto de Cavaco Silva ter tido o voto da direita não significa que ele seja de direita", caro Jorge. À direita, concedo, "só teve ilusões quem quis". Mas convenhamos que foi muita gente. Alguns já andam aí a rosnar as primeiras pragas contra Belém na blogosfera, o que me parece lógico. Como gostava de dizer Victor Cunha Rego, as coisas são o que são.

Pensamento do dia

Apenas os meteorologistas conseguem superar os economistas a falhar previsões.

Os três grandes











De realçar aquele traço encarnado aqui em baixo. É o SLB.
Fonte: A Bola

Soldados jornalistas

O exército canadiano está a treinar alguns dos seus soldados para poderem trocar as suas armas por microfones, câmaras de filmar e computadores portáteis em teatros de guerra como o Afeganistão. A importância da propaganda militar conhece hoje novos desenvolvimentos, com técnicas de manipulação nunca vistas. Sublinho aqui propaganda e não informação. É por estas e por outras que os grandes órgãos de informação mundiais não podem abster-se de enviar profissionais para a cobertura dos grandes acontecimentos.

Momentos Kodak (18)

Já há muitos anos Salazar tinha razão, temos de trabalhar mais e melhor...
(Setembro 2006)
Foto: José Carlos Carvalho

Mozart censurado

Depois das erupções de violência provocadas no mundo islâmico contras as caricaturas surgidas num jornal dinamarquês, depois dos apelos à morte em nome de Alá suscitados por uma citação descontextualizada do Papa, surge agora a autocensura ocidental em todo o seu esplendor: a vergonhosa retirada de cartaz da ópera Idomeneo, de Mozart, por decisão da direcção da Ópera de Berlim. Desta vez não foi preciso sequer haver protestos: bastou o vago temor de que os radicais islâmicos pudessem irritar-se com uma cena que mostra Idomeneu, rei de Creta, a exibir a cabeça decapitada de Maomé, no final do espectáculo. “Foi um erro retirar a ópera. É preciso dar prioridade à liberdade de expressão”, criticou a própria chanceler alemã, Angela Merkel. Em vão: 215 anos depois da sua morte, Mozart acabou mesmo censurado naquela que já foi uma das cidades mais livres do planeta. Na ópera, surgiam também as cabeças decapitadas de Buda e de Jesus. Mas isso não interessava nada: Maomé voltou a ser o problema.
Depois disto ainda haverá quem pense que a expressão “choque de civilizações” é exagerada?

Anda tudo trocado

No debate mensal no Parlamento, "o primeiro-ministro fez um ataque cerrado ao projecto do PSD para a reforma da segurança social", esclareceu-me o pivô da SIC Notícias. Pensava eu que o PSD fazia oposição ao Governo. Afinal é o Governo que faz oposição à oposição.

Foi à Eusébio

O belo golo de Nani em Moscovo, contra o Spartak, no jogo que ontem deu ao Sporting o quarto ponto na Liga dos Campeões.

quarta-feira, setembro 27, 2006

Momentos Kodak (17)


Foto: Rodrigo Cabrita

Gostei de ler

1. Eu, que só sei a tabuada e mal. De Ana Cláudia Vicente, n'O Amigo do Povo.
2. O melhor de Portugal. De Rita Barata Silvério, na Rititi.
3. Carta aberta a um secretário de Estado. De João Gonçalves, no Portugal dos Pequeninos.
4. Crónicas do Sistema (XI). De Rui Costa Pinto, no Mais Actual.
5. Ricas vidas. De Isabel Goulão, na Miss Pearls.
6. O enermúgno. De Rui Bebiano, n'A Terceira Noite.
7. Fazer barulho por Darfur. De Sabine, na Insustentável Leveza.

Benzida esquerda (1)

Parece ter causado grande escândalo o facto de José Sócrates se ter benzido numa cerimónia pública. As críticas vieram sobretudo de uma certa esquerda que apregoa a “modernidade” aos quatro ventos enquanto policia os mais ínfimos pormenores do comportamento alheio. E se neste domínio há atitudes recentes de governantes portugueses realmente passíveis de crítica, como o ministro da Economia detectado em flagrante excesso de velocidade numa auto-estrada, não consigo entender porque é que o facto de Sócrates se ter persignado escandalizou tanto estas vestais preocupadas com os rumos da “laicidade”.
É nestas alturas que me lembro de Franklin Delano Roosevelt e Winston Churchill orando juntos no navio Prince of Wales, ao largo da Terra Nova, em plena II Guerra Mundial. Ou de Charles de Gaulle e Konrad Adenauer ajoelhados em 1962 na catedral de Estrasburgo, pedindo a iluminação divina na magna tarefa da edificação de uma Europa unida e em paz perpétua. Ou, muito mais recentemente, o presidente brasileiro Lula da Silva – esse símbolo da esquerda contemporânea, esse arauto de uma certa “modernidade” progressista – participando numa missa de acção de graças ao Senhor do Bonfim logo após a sua investidura, em Janeiro de 2002, não perdendo então uma oportunidade de comungar defronte de fotógrafos e operadores de imagem. O mesmo Lula que termina os seus comícios na actual campanha presidencial brasileira lançando este brado piedoso aos seus apoiantes: “Que Deus vos abençoe!”
E reparem que nem precisei de mencionar o precedente aberto por António Guterres para concluir que Sócrates se encontra afinal em boa companhia...

Benzida esquerda (2)

Não resisto a transcrever aqui o emocionado relato que Churchill fez do serviço religioso em que participou com Roosevelt ao largo da Terra Nova, nesse dia 10 de Agosto de 1941, quando ambos firmaram o que viria a ser conhecido por Carta do Atlântico – pioneira da futura Organização do Tratado do Atlântico Norte. Até pela prosa, que é de inegável qualidade (não esqueçamos que Churchill foi galardoado em 1953 com o Prémio Nobel da Literatura, depois de Mauriac e antes de Hemingway). Em nenhum momento certamente ocorreu aos dois estadistas que a “laicidade” americana ou britânica estariam a ser postas em perigo com esta notória manifestação de fé.

“Na manhã de domingo, 10 de Agosto, Roosevelt subiu a bordo do 'Prince of Wales' e, acompanhado dos oficiais do seu estado-maior e de algumas centenas de representantes de todas as fileiras da marinha norte-americana, assistiu ao Divino Serviço no convés da ré. Todos sentimos esta cerimónia como uma expressão profundamente comovente da unidade na fé entre os nossos dois povos, e ninguém que nela tenha participado alguma vez esquecerá o espectáculo proporcionado pela luz solar no apinhado convés – o simbolismo da Union Jack e da Stars and Stripes drapejando lado a lado no púlpito; os capelães americano e britânico partilhando as leituras; as mais elevadas patentes da Marinha, do Exército e da Força Aérea da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos reunidas como um só corpo atrás do Presidente e de mim; os marinheiros, em linha compacta, partilhando Bíblias e juntando-se fervorosamente nas orações e nos hinos familiares a todos eles.
Eu próprio escolhi os hinos – 'For Those in Peril on the Sea' e 'Onward, Christian Soldiers'. Terminámos com 'O God, Our Help in Ages Past' (…). Cada palavra parecia vir do fundo do coração. Foi um grande momento que ali vivemos. Cerca de metade dos que cantavam naquele instante iriam morrer em breve.”


(Winston Churchill, The Second World War, volume III, “The Grande Alliance". Penguin Books, 1988, página 384. Tradução minha)

Uma campanha alegre

Exemplos de política bem humorada não faltam no Brasil, como se pode verificar na campanha eleitoral em curso. Espreitem só isto (com a devida vénia ao Eurico de Barros, que "importou" as imagens) e preparem-se para soltar umas boas gargalhadas.

Pai tirano (finale)

Caro João Villalobos:

Não pretendo dar receitas sobre educação a ninguém. Mas justifico-me: nessa matéria, em minha casa, cada decisão é tomada em liberdade, a seu tempo, e tendo em conta uma realidade que não é estática. São opções feitas em consciência e da exclusiva responsabilidade da minha mulher e minha, tendo como fim único, o bem das crianças.
Sem querer entrar na discussão sobre o valor (e valores) daqueles conteúdos - Morangos com Açúcar e quejandos , do que conheço deste novo género de novelas, é que chegam a durar quase três horas seguidas, de manhã, à tarde e à noite; numa fórmula alienante que de facto prende as crianças, principalmente as mais pequenas. Acontece que elas têm que estudar, por exemplo, e a Natália, a nossa leal empregada, tem algumas limitações no campo da pedagogia. Assim, considero o bloqueio de canais uma bela ferramenta de controlo parental à distancia.
Assim como o João, eu também sempre “li tudo o que apanhei pela frente” (a minha mulher igualmente, o que faz da minha casa um pequeno mundo de livros). Isso é diferente. E os meus miúdos (refiro-me evidentemente aos mais velhos, com 14 e 16 anos) sabem que são livres de ler (quase) tudo o que apanhem pela frente. Fico muito contente até. E desde que acompanhados, também podem ver (quase) todo o cinema. Acho que são crianças livres porque não são alienadas. Na literatura, cinema, televisão ou internet, só reprimimos a estupidez.
Aliás, em nossa casa vigora uma saudável meritocracia de que me orgulho. Assim saibam os miúdos gerir a liberdade que têm, e tudo corre bem. Dá trabalho mas preferimos assim.
De resto, caro João, parece-me cruel deixar uma criança de cinco anos entregue à sua "pouco treinada" vontade. A ser “educada” pela televisão (os outros já não vão nessa, não têm pachorra). Aquilo (os Morangos e a Floribela) está feito de forma a prender os miúdos, e os mais pequenos são as vítimas mais fáceis. Prefiro que a Carolina termine a tarde a meter-se com os irmãos mais velhos, a pintar, a escrever palavras no frigorífico com as letrinhas coloridas. Ou, num dia de sorte, comer um "yogurt surpresa" na cozinha a ouvir a Natália a contar-lhe histórias enquanto engoma, enquanto a mãe não chega.

Com amizade,

De morangos já o Bergman falava

Eu, quando era miúdo, li tudo o que apanhei à mão. Na biblioteca dos meus pais e, quando se esgotaram, nas bibliotecas públicas. Certo dia, um bibliotecário quis impedir-me de requisitar livros porque, dizia ele, «não eram para a minha idade». O senhor, diga-se de passagem porque podia ser de outro partido qualquer, era comunista. Queixei-me em casa e tive carta branca para ler o que entendesse, com reprimenda severa à direcção da biblioteca.
Hoje, é a televisão. Codificar canais ou proibir ver, é não confiar no discernimento dos nossos filhos nem na educação que lhes damos. Entender esses programas e dar-lhes o enquadramento que merecem, é confiar na nossa capacidade de acompanhamento da contemporaneidade e da sociedade que temos, queiramos ou não que ela fosse diferente. O mundo sempre foi perigoso e perverso. Hoje, é-o mais claramente que ontem. E isso é bom. Não há redomas que o façam ser de outra maneira.
Por isso, caro João, eu dialogo, explico e digo o que tenho a dizer. Mas não codifico, nem proibo, nem me armo em Maria Filomena Mónica como se habitasse num Xanadu intocável pela realidade que me cerca e às pessoas com quem vivo. Não tome isto como um comentário pessoal. É apenas o respeito muito grande que me merece que faz com que o escreva. De coração aberto. E sem códigos.

Mostra-me o teu cachecol

"O Benfica fez uma excelente primeira parte, vulgarizando a equipa do Manchester", disse ontem um comentador da RTP-N. O comentador era António-Pedro Vasconcelos, o programa era o Trio d'Ataque. Vasconcelos é benfiquista, o que pelos vistos o abalizava a "comentar" o jogo Benfica-Manchester, em que os "encarnados" foram derrotados por 0-1. Pus-me a pensar: se a moda pega, e alastra do futebol à política, lá teremos "comentadores" socialistas a avaliar a prestação do Governo ou sociais-democratas a pronunciar-se sobre o desempenho de Marques Mendes. Esta tendência para pôr um cachecol ao pescoço ou um emblema na lapela é que está a dar. A isenção não vende...

Estou contigo, Kate

Queria prestar aqui a minha homenagem a Kate Winslet. A estrela de Titanic tirou-me as palavras da boca ao criticar as esqueléticas que se pavoneiam em Hollywood impondo um padrão de beleza que nada tem a ver com a nossa saudável tradição latina. Ela, Kate, está-se nas tintas para esta moda que não tardará a ser atirada para o caixote de lixo da História. "A moda da magreza deixa-me com muita raiva e incomoda-me", desabafou a bela actriz, que não quer saber de jejuns forçados. O facto de ser casada com o realizador Sam Mendes, de ascendência portuguesa, talvez ajude. É que nós não confundimos beleza feminina com expositores de ossos...

Conversa de praxe

Esta manhã, no metro, dois estudantes universitários - obviamente caloiros - falavam em alegre alvoroço do "tribunal". Às tantas percebi a que "tribunal" se referiam, com tão manifesta benevolência - para não dizer mesmo com visível entusiasmo. Era ao "tribunal da praxe". Ao ouvi-los acolher assim tão de bom grado uma das práticas mais aberrantes que subsiste na sociedade portuguesa, não contive um pensamento politicamente incorrecto: aqueles dois mereciam que os "veteranos" lhes aplicassem uns calduços no cachaço. Seria muito bem feito.

Pai tirano

Em minha casa, tenho a TVI codificada de forma que só com a anuência dos adultos se acede a esse canal de televisão. Ainda não decidimos codificar a SIC (já esteve mais longe) pois Floribela parece não ter pegado entre a miudagem. Connosco os Morangos e outros lixos são devidamente filtrados, para que os miúdos tenham tempo para estudar, ler e brincar de forma saudável. A única criança que ainda “estrebucha” um bocadinho é a Carolina, de cinco anos, em quem o programa exerce uma extraordinária atracção. Mas acontece que não cedemos ao seu capricho, pois a sua prioridade é o desenvolver da motricidade fina, brincadeira e outras coisas próprias da idade dela. Estimulamos antes o convívio com outros miúdos, livros, muitos livros, vídeos de contos e outros clássicos da Disney. De resto, sem mostra de qualquer trauma psicológico, ela até conhece os heróis, e canta feliz as cançonetas mais populares dessas novelas. Nada a fazer, aprende na escola com as coleguinhas.

terça-feira, setembro 26, 2006

Da Republica de Dubrovnik

Voces estao fartos de escrever, e calculo que bem. Vou ter muito que ler quando voltar, porque por enquanto a patria, felizmente, e uma realidade distante (nem sequer tenho os acentos adequados). Abracos a todos.
p.s.: um beijo a republicana f. o guia tem dado um jeitao. e voltara em excelentes condicoes

Triste remake

Confirma-se aqui. Com o encerramento da Johnson Controls, vão mais 875 postos de trabalho directos ao ar, juntando as fábricas de Nelas e de Portalegre. Depois da GM, a saga da deslocalização do investimento estrangeiro continua. É o mesmo filme, com os trabalhadores a prometerem formas de luta, quando o que se passa é inelutável, na parte que lhes diz respeito. Portugal perde competitividade, atrás da Estónia, República Checa e Eslovénia, quanto mais da Espanha. Enquanto isso, o Governo sonha. Mas ao contrário da canção, Portugal não avança. E só pula em direcção ao abismo. Sem pedra filosofal à vista.

Uma dor de alma

A respeito da posta do João Villalobos aqui em baixo, acontece que eu, integrado na organização, acompanhei de perto algumas cimeiras de Chefes de Estado. Sempre deu para constatar o grau de anonimato dos nossos representantes, já para não falar do nosso insignificante peso político nos variados contextos. Nestas “feiras de vaidades” não fossem os protocolos e banquetes organizados, ou então a patriótica lealdade dos jornalistas, corpo diplomático e restante staff acreditados, muitas vezes os nossos mais altos dignitários ficariam a falar para o boneco.
Não mais me esqueço do que vi quando em Dezembro de 1997 eu integrava a comitiva de António Guterres na Cimeira Ibero-Americana na Ilha Margarita (Venezuela): à passagem da comitiva de Juan Carlos, o povo em vinha à rua em festa, tapetes nas janelas e “vivas ao Rei”. Aliás, para os venezuelanos, tão popular quanto o monarca dos seus ex-colonizadores só o amigo Fidel. Dá que pensar.

Teste 1, 2, 3

Estou a aprender a pôr vídeos aqui. Como o Nuno e outros fazem. Comecemos por este, para dar sorte para amanhã em Moscovo.

Operação Mãos Livres

Caro FAL, de facto não posso concordar. Fiz cuidadosamente as contas: Os 220.000 euros, divididos pelos 365 dias do ano, dão como resultado 602,7 euros/dia.
A um tarifário elevado (50 cêntimos por minuto), isto dá para 1.204 minutos de conversação. Ou seja, 20 horas por dia ao telefone.
Depois destes cálculos, dignos de um Prémio Ignobel, só reforço a minha preocupação: Se não utilizar um auricular bluetooth, que seja pelo menos um sistema de mãos livres. Só isso o salvará de irreversíveis e perniciosos efeitos cerebrais. E isso não se deseja a ninguém.

Não tem salvação...

...mas é sem dúvida coerente. Até Deus a f. escreve com letra minúscula.

Gastos

É muita massa, só para termos um primeiro-ministro sempre contactável e em linha directa com todo o seu gabinete. Ou não é? Eu cá acho, independentemente do que defendeu o João, aqui em baixo.
João, não me digas que pões a hipótese de o nosso PM ter daqueles auriculares sem fios, com bluetooth, como muitos que andam por aí com aquela coisa na orelha e ao volante, mesmo que não estejam a falar com ninguém?.. Nunca estão.

História de algibeira (4)

Ao passar em Alcântara, o Palácio das Necessidades pareceu-me hoje particularmente atraente, talvez devido à transparente e radiosa manhã que se fazia sentir em Lisboa. Gosto daquela casa, onde trabalhei durante um período particularmente feliz da minha vida.
O convento foi mandado construir no séc. XVIII por D. João V no local onde existia uma ermida em honra de Nossa Senhora das Necessidades. Tornou-se residência da dinastia Bragança a partir de D. Maria II, ou seja, foi a residência oficial do chefe de estado até 1910.
Tendo o Rei D. Carlos desenvolvido uma intensa actividade diplomática, procederam-se no seu tempo a obras de beneficiação tendo em conta os jantares e recepções de Estado. Bombardeado no dia 4 de Outubro de 1910 a partir do rio pelos rebeldes republicanos a bordo do Adamastor, o Palácio das Necessidades foi desde então adoptado para albergar o ministério dos Negócios Estrangeiros, mantendo-se assim ainda hoje a sua vocação para as relações internacionais do estado português.

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Ordem de pagamentos

Já isto, como direi, me parece um bocadinho mal: «Segundo um aviso da Direcção-Geral do Tesouro, publicado segunda-feira em Diário da República, os primeiros funcionários a serem pagos, no dia 20 de cada mês, são os membros do Governo, os militares os diplomatas e os reformados».

Os portugueses conhecem-no (mas só eles)

Jorge Sampaio não é conhecido em Belém do Pará nem pelo Reitor da Universidade da Amazónia. Não me espanta. Ri-me mesmo muito com a notícia do 24 Horas , mas é evidente que poucos portugueses há cuja cara seja reconhecida mal passam a fronteira e chegam a Badajoz. E são todos futebolistas.

Espero é que use auricular

Não serve de nada vir comparar o plafond de 220 mil euros para chamadas de telemóvel/ano e escrever que «dava para comprar um T2 no centro de Lisboa ou 10 carros médios» como fez o Portugal Diário. É populista e sem sentido objectivo. Podiam, já agora, fazer a conta em pacotes de fraldas de bebé e ia dar ao mesmo.
Sou insuspeito ao defender José Sócrates, mas na verdade o montante não é diferente do habitual dado a um Primeiro-Ministro e não vi, até agora, divulgado quanto é que ele efectivamente gasta, apenas quanto pode gastar se o necessitar (não que isso me interesse).
Este discurso moralizador de tendência pequeno-burguesa irrita-me e já vem do tempo do senhor D. Carlos, quando a imprensa fazia constantes críticas às suas dívidas e gastos. Na realidade, defendo que o gasto em comunicações do Primeiro-Ministro até devia ser ilimitado, e acredito no bom senso do senhor para não emprestar o telemóvel à família ou amigos, seja para participarem no Forum TSF ou encomendarem pizzas. Só lhe recomendo que use auricular. A bem da saúde.

Blogues em revista

Hoje Há Conquilhas: “Muitos dos votantes de Cavaco Silva não andam contentes com a sua actuação. Criticam-no por tudo e por nada. Até parece que acreditaram que o homem, uma vez eleito, ia mesmo desempenhar o cargo de primeiro-ministro.” (Tomás Vasques)
Papagaio Morto: “Em terra de árbitros quem não vê a mão na bola é rei.” (Leonardo Ralha)
Tomar Partido: “Cá para mim o envelope 9 foi colado com cuspo (descola rápido).” (Jorge Ferreira)
Retórica: “O toxicodependente tem direito a seringas de borla. O diabético (insulinodependente) é obrigado a pagá-las...” (Américo de Sousa)
Pensamentos: “Ainda alguém me há-de explicar porque é que as reestruturações se fazem sempre à custa das pessoas.” (Ilídia Pinto)
Portugal dos Pequeninos: “Se repararmos na parte das livrarias que atrai mais público, ficamos esclarecidos. 'Esoterismo','espiritualidades' e 'religião' têm sempre clientes. A 'era do vazio' gera subprodutos mitómanos.” (João Gonçalves)

segunda-feira, setembro 25, 2006

Cavaco e os sonhos frustrados da direita

Uma certa direita, com sede de poder mas pouco ou nada vocacionada para fazer oposição, gostaria que Aníbal Cavaco Silva trabalhasse por ela – isto é, que conduzisse a partir do Palácio de Belém as operações de desgaste contínuo do Governo socialista. Essa direita bem pode esperar sentada: Cavaco não lhe fará a vontade.
Desde logo por uma questão institucional: o actual Presidente da República interpreta os poderes que a Constituição lhe confere numa perspectiva que em nada se adequa às teses instrumentais postas em prática por Mário Soares quando exerceu as mesmas funções. Ao contrário de Soares, que tinha como desígnio estratégico contribuir para o ressurgimento do PS enquanto alternativa viável de poder, Cavaco não se comove com os dilemas existenciais do PSD: nunca escondeu uma certa aversão à vida partidária, mesmo quando liderava os sociais-democratas, e hoje está ainda mais longe desse universo onde fervilha a pequena intriga.
E depois também por uma questão de fundo: Cavaco foi, durante anos, o alvo preferencial da direita que hoje gostaria de o ver como ponta-de-lança numa ofensiva anti-PS. Era o tempo em que o “cavaquismo” surgia ridicularizado nas colunas de opinião do Independente, que o pintavam como um esquadrão de pacóvios de peúga branca. O actual chefe de Estado, tanto ou mais que José Sócrates, detesta a direita que reclama direitos naturais de acesso ao poder por pergaminhos sociais, fortunas adquiridas ou apelidos sonantes. A mesma direita que o odiava quando ele estava no lugar de Sócrates jamais contará com o aval do actual inquilino de Belém para golpes palacianos.
Não perceber isto é não perceber nada sobre as forças que se digladiam nos bastidores da política portuguesa. A direita quer desgastar o Governo? Arregace as mangas e vá à luta. Se Sócrates mantiver o entendimento institucional que estabeleceu com o Presidente da República e acentuar o ímpeto reformista, por esse lado nada terá a recear. Deste PSD e deste CDS que agora brincam às oposições, certamente também nada receia: uns limitam-se a reivindicar novos “pactos” que os façam sonhar com umas migalhas de poder, outros apunhalam-se mutuamente com requintes florentinos.
Cavaco não pode estar mais distanciado de tudo isto. Com o seu instinto natural, ele sabe bem que os portugueses não o elegeram para ser o “cavalo de Tróia” da direita dos interesses, cuja inépcia política salta à vista.

Clinton Vs. Fox

No canto esquerdo, Fox News, uma das estações televisivas com maior audiência nos EUA. No canto direito, Bill Clinton, ex-presidente dos EUA. Meus senhores, sentem-se, puxem do cigarro, das pipocas ou da manta, e apreciem...

Dois homens e um telemóvel

O Presidente da República de Portugal ofereceu um telemóvel/PDA com software nacional ao Rei de Espanha logo no arranque da visita oficial. Cavaco Silva não perdeu tempo. Aterrou em Espanha e começou logo a vender aquilo que acha que Portugal tem de melhor. Empreendedorismo e hi-tec. Acho muito bem.
Mas gostava de saber mais sobre o produto. O telemóvel é rápido? É pequenito? É levezinho? Tem bigode?

Cascais é um carrocel, my friend

Transbordando com a vontade de visitar um novo restaurante, mas sem saber bem onde abriu as portas nem por que caminhos seguir, recebi o seguinte auxílio quanto ao itinerário mais apropriado:
«Sais onde diz Alcabideche, chegas a uma rotunda grande antes do Cascaishopping, fazes essa rotunda toda e só viras onde diz Cascais. Continuas sempre em frente e vais apanhar duas rotundas novas. Continuas em frente em direcção a Cascais. Entretanto vês uma bomba de gasolina do lado esquerdo e logo a seguir tens mais uma rotunda. Nessa, viras na segunda saída e continuas sempre a descer».
Depois de ler isto, desisti. Já me sinto tonto que chegue. No regresso, ainda era capaz de regurgitar a refeição.

É isso mesmo

"Há que respeitar os outros. Se Deus não quis que todos tivessem uma só religião, quem sou eu para o querer?"
David Munir, teólogo islâmico e imã da Mesquita Central de Lisboa, em entrevista à revista Domingo, do Correio da Manhã

Quando a nostalgia toca

Com o devido respeito pelo nosso FAL, hoje estou mais numa de reviver isto. (Aviso: Não recomendado a ouvidos sensíveis).

Quem não sabe aprende

Vi-me compelido a ganhar um concurso no Incontinentes Verbais, para poder finalmente descobrir o significado de «zimbório». Parece impossível. Agora, se quiserem saber o que é, têm de fazer uma visita aos vizinhos.
Fiquei esclarecido, mas intrigado. Por que razão Soares e Carlucci se reuniram debaixo de um chapéu de senhora? Isto está cada vez mais misterioso.

Música para os seus ouvidos














Importam-se que sugira esta?
Da dupla Jane Birkin/Serge Gainsbourg, Je t’aime, moi non plus...

Não conseguiu travar?

O Correio da Manhã escreve hoje que "o ministro da Economia e Inovação foi o único responsável governamental a não conseguir travar o aumento das despesas correntes no seu ministério no primeiro semestre deste ano". Atenção aqui para o uso da palavra "travar". Julgo que não terá sido ao acaso... Dá para pensar que não é só na estrada que a velocidade do ministro é grande.

Brasil e Portugal

A Galeria Graça Brandão fica no n.º 26 da Rua dos Caetanos, em Lisboa. E agora tem em exposição "Olho D’água" (escultura), do brasileiro Efrain Almeida, e as pinturas do português Paulo Quintas (1966, Ericeira). A não perder.
Uma vista de olhos pelo site da galeria revela também excelentes contactos e artistas de nomeada no portfolio. Como o grande (em tudo o que faz) escultor Rui Chafes. Em breve, segundo o que me contou o Pedro (um dos proprietários), há a expectativa de acontecimentos que envolvem alguns nomes da cena internacional artística. Em jogos combinados, que misturam de tudo um pouco. Arte plástica, música, teatro. Numa demonstração de que não somos pequenos em tudo. Esta galeria é mesmo das poucas que está no circuito internacional dentro do seu género.

A ler

Entrevista de Aníbal Cavaco Silva ao El País de ontem. Arranca com o pormenor da gravata (supostamente com uma nódoa, imperceptível para os jornalistas, mas que o Presidente resolveu ir trocar antes de começar a sessão fotográfica), percorre temas como o referendo ao aborto, os aviões da CIA, a relação com nuestros hermanos, a crise no Médio Oriente ou a evolução comparada de Portugal e Espanha depois da entrada na Europa comunitária. As excelentes fotografias são do João Pina (filho de Joaquim Pina Moura), que trabalhou comigo há uns anos.
Voltaremos à entrevista, porque tem material importante para anáslise. Mas deixo a pergunta: Seria esta conversa (neste tom) possível por cá?
Aqui vai um excerto: "Soy un hombre contento con la vida, me ha tratado bien. No salí de la jefatura del Gobierno nada frustrado. Trabajé mucho, y Portugal dio un paso adelante. Me fui con la conciencia tranquila, y eso es importante en la vida política. Volví a mi puesto de catedrático universitario. Y volví con toda tranquilidad. No esperaba regresar, y por eso escribí mis memorias. Pero donde aprendí de verdad fue durante el paso por el poder. Tuve suerte: viví muchos cambios en el mundo. Cuando acabé la etapa de primer ministro era una persona mucho más rica. Y no en el sentido material. En ese sentido, me empobrecí. Durante años mantuve cierta distancia hacia las cuestiones políticas, y de alguna forma, psicológicamente, gané la preparación para ejercer hoy una función que es diferente."

Lá que tenho escrito muitos disparates...

«No entanto, o reino por excelência deste tipo de informação (as teses da conspiração) são os blogs. Essa curiosa realidade, que democratizou a informação e o debate, fez também explodir o disparate, o mau gosto, a maledicência».
João César das Neves, no DN.

Helena Roseta, sempre sincera

«Sabemos de onde vimos, mas não para onde vamos».

Até pareço de esquerda

O Luis Aguiar Santos escreve, no O Amigo do Povo, a propósito da recente greve dos trabalhadores do Metropolitano de Lisboa: «eu acho que o "direito à greve" não tem lugar num Estado de Direito».
O nosso Pedro Correia também já aqui escreveu sobre este assunto. Não sei se vai tão longe nas críticas aos trabalhadores como o Luis, mas espero bem que não.
Eu, lamento dizê-lo, estarei sempre do outro lado de quem queira eliminar este direito cuja justificação histórica (desde o seu início em França) demonstra como, muitas vezes, foi a única ferramenta possível contra os exageros e práticas mais selvagens de exploração da mão de obra.
Por vezes não é aplicado da melhor forma? Eventualmente. Há outras formas de reivindicação que são pouco utilizadas e seriam mais simpáticas e até eficazes? Talvez. Mas isso discute-se pontualmente e caso a caso. Eliminar a greve como direito? Isso espero bem que nunca. Um «Estado de Direito», para mim, inclui direitos para todos. E não só para alguns.

Corredores sem fundo

Fico a saber, pelo 24 Horas, que Luis Filipe Vieira ficou à frente de José Sócrates na meia-maratona. Ou, como titula o jornal, que o «Benfica ganha a corrida ao Governo». Que há de novo nisto, pergunto eu? É só olhar para o negócio do Centro de Estágios do Benfica com a Caixa Geral de Depósitos (a qual financiou a construção para depois pagar o empréstimo com o seu próprio patrocínio), para ver como o resultado da corrida há muito não causa surpresas a ninguém. Citando a nossa Rainha Santa, «são rosas, senhores».

Norte encontra Sul

Estocolmo e Lisboa juntaram-se neste projecto que pretende desenvolver as ligações entre o Fado e a música popular sueca. É de louvar. Agora se é de ouvir, ainda vou investigar.

As palavras dos outros

Gostava de ter escrito isto: Recordar a Mensagem, por Vox Patriae – Incontinentes Verbais

A dívida em dúvida

Pela primeira página do Diário de Notícias, sou informado que devo mais de dez mil euros ao estrangeiro. Naturalmente, já não tomei o pequeno-almoço descansado.
Pouco depois, acalmado o ritmo cardíaco e ao ler melhor a notícia, descubro que afinal não sou quem deve mas o País. E lendo melhor ainda, que são os nossos bancos a dever aos bancos internacionais. Suspiro de alívio. Esta mania de dividir as contas nacionais pelo número de cabeças dos portugueses tem de acabar. Então mas que é isto? A César o que é de César.

Diálogo epistolar

Não tenho livros de auto-ajuda no sentido que agora se dá à designação, mas não prescindo de outros que dão auxílio a questões mais práticas da vida. Um deles é Cartas de Amor para Namorados que inclui «Os mais modernos modelos de declarações de amor (...)contendo também Como escolher mulher e Como escolher marido».
Esta última parte é-me favorável dado que, nascido em Novembro «darei um excelente marido» embora, muito amigo de fazer as minhas vontades, tenha tendência a tornar-me um tirano. Não posso negar nem uma linha. Hoje, leio este pungente diálogo epistolar:
«Ex.ma Sr.ª:
Viúvo de há um ano, apenas, arrasto uma vida infeliz com uma filha pequenina que, sendo o meu enlevo, me tortura porque não posso, de modo algum , substituir a mãe que ela perdeu.
Quis muito a minha mulher; e essa afeição que durante tantos anos lhe dediquei, são grantia para aquela que se dignar aceitar o título de esposa que estou pronto a dar-lhe.
V. Ex.ª é mais nova do que eu, é certo; mas mais próxima está da idade da minha garotita.
V. Exª. quererá ser a mãe amorosa, que a morte prematuramente lhe roubou?
Não supõe como lhe ficaria grato o meu coração, tanto mais que a sei boa e afectiva.
Ansioso por conhecer o seu desiderato, sou de V. Exª. F...»

A resposta, recomendada pela autora Maria Celeste, é a seguinte:
«Exº. Sr.
Agradecendo a sua carta, lamento não poder ser-lhe agradável.
Sou muito nova para tomar os encargos de mãe adoptiva, e não só tenho falta de experiência, como também de conhecimentos da vida de casados.
Embora goste imenso de crianças, não me sinto com forças para ocupar o lugar da sua falecida esposa e de ser madrasta da sua filha.
Creia que lhe falo com toda a lealdade, F...»

Ó desapiedada Maria Celeste, não podia ter recomendado às senhoras uma resposta mais simpática e compassiva? Tsc, tsc.

domingo, setembro 24, 2006

Ibéria, nossa salvação? (crónica)

Helena Vaz da Silva comentava uma vez comigo que o que é verdadeiramente salutar na vida é preferirmos sempre a estação do ano que atravessamos. Apreciar sempre o presente, as divinas dádivas de cada momento ou época. Contra o choradinho do “sol que me faz falta”, do “antigamente é que era bom”, ou da fraca psique que “não suporta a escuridão dos dias invernosos”. Falava da mediocridade. Vindo que quem veio, ficou-me como lição.
Veio-me à memória esta conversa por causa da sondagem apresentada ontem pelo Sol, que reflecte a opinião de um velho partido que vê na União Ibérica a solução, a viabilização da nossa felicidade colectiva.
Tenho a dizer que estes 26% de cidadãos portugueses põem definitivamente à prova a minha calejada sensibilidade democrática. Conheço o discurso vindo de circunstanciais convivas, com argumentos mais ou menos elaborados. Uns consideram inclusivamente a existência de Portugal como um fenómeno antinatural. Outros, quando os oiço destilar as suas obtusas justificações, indicam-me tão só a sua imensa ignorância, como se revelam impotentes frustrados que acusam a contingência da sua nacionalidade como causa das suas limitações. Não será que quem não sabe dançar parece-lhe o chão estar torto? Além disso nunca percebi bem se este lírico ensejo de unidade ibérica incluiria todas as províncias espanholas com os seus distintos estágios de progresso social e económico.
Enfatizar constantemente a bela relva do vizinho ou a gratuita “merdização” da Mãe Pátria e suas circunstâncias parece-me atitude algo doentia. Esse discurso acompanha-se normalmente com apelos a equívocas soluções messiânicas, sejam a Monarquia, Oliveira Salazar ou qualquer redentora Espanholização do país. A mim parece-me que estes compatriotas que habitam um inviável país de criminosos, incompetentes e corruptos justificam desta forma a sua medíocre inabilidade e falta de ambição. No seu imaculado e desresponsabilizante limbo, desgastam as suas preciosas energias em lamentos e ódios pueris, em vez de, pela força dos seus braços e pelo exercício da sua vontade, meterem as mãos à obra.
E porque há muito que fazer, uma atitude positiva é um factor decisivo, tanto aqui como em qualquer das espanhas que me queiram vender.

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Luminosa decisão

Ontem tomei a decisão: aos Sábados, nos próximos tempos, comprarei o Sol em vez do Expresso. Esta fórmula, sem alterar o meu rigor orçamental, permite-me comprar também o DN de que eu dolorosamente prescindia aos Sábados. Além do preço, bastante ergonómica me pareceu também a arrumação gráfica dos conteúdos. E as revistas. Alguns colaboradores, redactores e colunistas sustentam também esta minha opção.
Finalmente, o argumento das ofertas promocionais comigo já não pega bem. Além de ter um clube de vídeo aqui na rua, prezo muito boas edições, selectividade e algum protagonismo pessoal nas escolhas do “material” que entra cá em casa. Já temos tralha a mais, nem queiram saber!
A propósito: algum leitor amigo se candidata a adquirir uma expendida colecção Prémios Nobel, edição Diário de Notícias de 2003 em 50 volumes? Como nova! Eu ofereço um caixote de cartão e um bilhete de comboio.

P.S. Do novo semanário é de aplaudir que em conjunto com a assinatura de cada rubrica ou notícia se publique o respectivo endereço de e-mail, promovendo a salutar interactividade do jornalista com o leitor.

Madame nostalgie

Deve ser destas horas cinzentas de Outono: hoje deu-me para escutar a Françoise Hardy, o que já não sucedia há muito.

Comme les garçons et les filles de mon âge /Je connaîtrais bientôt ce qu'est l'amour /Comme les garçons et les filles de mon âge /Je me demande quand viendra le jour.

Vou continuar assim, em francês, pelo resto da tarde. Há aqui muito para ouvir: Le Métèque, de Georges Moustaki; Nathalie, de Gilbert Bécaud; L'Été Indien, de Joe Dassin; Que C'est Triste Vénise, de Charles Aznavour; Tombe La Neige, de Salvatore Adamo; Sous le Ciel de Paris, de Juliette Gréco; C'est Si Bon, de Yves Montand; Ne Me Quitte Pas, de Jacques Brel. Merci beaucoup, Luís Novaes Tito, pela sugestão. Só falta mesmo Les Feuilles Mortes, a mais bela chanson de todos os tempos.

Adenda. Agradeço a Francisco Seixas da Costa o envio do poema Le Déserteur, de Boris Vian, que se encontra na nossa caixa de comentários: prometo não me servir dele quando me referir em breve a uma das mais ilustres figuras do PS. Agradeço também aos amigos do Tugir, que me puseram a ouvir Les Feuilles Mortes, na voz do Montand.

Valha-lhes Deus

O padre Carreira das Neves leu a palestra do Papa Bento XVI - intitulada Fé, Razão e Universidade - que inflamou algumas secções da "rua árabe" que não a leram nem jamais a lerão. Considerou-a "um documento notável", desde logo por "estabelecer pontes epistemológicas entre a Fé a Razão". O próprio Pontífice acentuou na sua alocução, em termos que não deixavam lugar a dúvidas: "Não agir de acordo com a razão é contrário à natureza de Deus."
Notável. Lamentavelmente, esta palestra incendiou os ânimos dos islamitas radicais, que mal ouvem falar em razão puxam logo da pistola. É com esta gente que queima efígies do Papa em público que alguns clérigos cá do burgo gostariam de estabelecer um "diálogo interreligioso" - entre eles o padre Neves, que num artigo no Expresso lança esta douta sentença: "O Papa não foi feliz." Separar violência e fé, como Bento XVI defendeu na universidade alemã de Ratisbona, terá sido "um acidente académico perigoso para a ideologia muçulmana dos nossos dias".
Nem o meu amigo Daniel Oliveira, ateu convicto, alinhou neste tom. Na coluna de opinião paginada ao lado da do padre Neves no Expresso, o Daniel acentua: "O Papa soube deitar água fria no fanatismo islâmico e no racismo que domina a nossa intelectualidade ocidental." Carreira das Neves não pensa assim. E acha até que a vandalização de igrejas na Palestina e o lançamento de cruzadas de morte contra Bento XVI constituem respostas "de acordo com a crítica do imperador bizantino" Manuel II que o Papa citou em Ratisbona.
E que crítica é essa, feita em 1391 pelo imperador a um interlocutor persa de fé islâmica? "Mostra-me o que é que Maomé trouxe de novo. Apenas encontrarás coisas más e desumanas, como a sua directiva de espalhar com a espada a fé que pregava." Horror! O Papa não devia ter beliscado, mesmo recorrendo à linguagem metafórica, esta relação entre proselitismo e actos violentos...
Chegado aqui, apetece-me subscrever o que disse ontem a Clara Ferreira Alves numa insuspeita tirada machista no Eixo do Mal: "Chega de baixar as calças!" É um argumento um bocado prosaico, reconheço. Mas depois de ver o padre Neves fazer coro com os radicais islâmicos nas críticas ao Papa Ratzinger, também não me ocorre nenhum mais expressivo que este. Às vezes penso que a Síndroma de Estocolmo não afecta só aqueles que são fisicamente prisioneiros, mas também os que se encontram espiritualmente sequestrados. Valha-lhes Deus.

O que eles dizem (3)

- "Sou de esquerda. Todos devíamos poder fumar um charuto e comer caviar."
Ricardo Araújo Pereira, Sol

- "Gosto da honestidade e da coragem do fado. (...) mesmo quando é mau. Mesmo quando é mal cantado."
Miguel Esteves Cardoso, Única

- "Não consegui comprar o Sol! Felizmente, a Rita comprou dois."
Marcelo Rebelo de Sousa, Sol

- "Portugal dá-me uma paz incrível."
Caetano Veloso, Única

Bola com bolor

Certos jornalistas desportivos abusam das frases feitas, dos lugares-comuns. Acompanho a transmissão de um jogo de futebol, vou escutando relatores e comentadores a utilizar expressões que já eram bolorentas no tempo da Maria Cachucha. Expressões como "moldura humana" e "estampa física". Pensava que ninguém já falava assim, mas equivoquei-me: o mundo do futebol é mesmo uma excepção. Até nisto.

O que eles dizem (2)

- "O processo Casa Pia, pelo modo como foi conduzido, veio criar uma aliança muito pouco santa entre políticos: os que não estão à venda e que em princípio apoiam políticas anticorrupção, e aqueles a quem só falta a tabela de preços."
Saldanha Sanches, Expresso (Economia)

- "O Islão é uma religião de paz. Mas, para dissipar as dúvidas, aparece sempre alguém disposto a matar em seu nome."
João Pereira Coutinho, Expresso

- "As posições no sexo fazem toda a diferença."
Margarida Rebelo Pinto, Sol

- "A magreza excessiva das manequins sempre me impressionou."
José António Saraiva, Sol

Concordo convosco

Estou de acordo com estas duas meninas. Com a Paula Moura Pinheiro, a propósito da recente polémica em torno do Papa: "A civilização ocidental tem de merecer-nos mais que uma permanente e culpabilizada autocensura. Ou devia Bento XVI pedir desculpa por falar do lugar da razão na religião?" E com a Carla Hilário Quevedo, que partilha comigo o culto do itálico na nossa escrita: "O itálico é a forma correcta (por isso elegante) de assinalar nomes de livros, palavras estrangeiras e de apontar a subtileza de determinadas palavras." Há muito que penso assim.

O que eles dizem (1)

- "A questão da segurança social é demasiado importante para ser deixada aos economistas." Nicolau Santos, Expresso (Economia)

- "Eu admitiria de bom grado que as mulheres são muito superiores aos homens, se elas parassem com esta mania de que são iguais."
Paulo Nogueira, Expresso

- "Desde há quatro anos, todos os dias tomo um antidepressivo."
Manuela Moura Guedes, Tabu

- "A noite funciona como uma terapia."
Vítor Rainho, Tabu

Boas histórias nos semanários

- EPUL tem 15 directores vitalícios. De Valentina Marcelino, no Expresso (manchete do jornal).
- Vasco Lourenço, capitão de Abril, cultiva flores no Alentejo e já as exporta para a Holanda. De Conceição Antunes, no Expresso.
- Torres, "velha glória" do Benfica, está cada vez mais doente, com Alzheimer, enquanto a homenagem do clube da Luz vai tardando. De Rui Antunes, no Sol.
- Obituário de Fernando Carneiro, que foi um dos melhores repórteres da sua geração. De Pedro d'Anunciação, no Sol.
- Um português vive hoje na casa londrina de Freud, entretanto transformada em museu. De Bruno Manteigas, na revista Tabu.
- Outro português faz canções para grandes cantores brasileiros. De Isabel Oliveira, na revista Única.
- As falsas promessas feitas aos brasileiros instalados em Vila de Rei. De João Morgado, no Sol.
- A odisseia de um "mochileiro" português nos labirintos de Luanda. De Gonçalo Cadilhe, na Única.

España, España, España

E ainda dizem que de Espanha nem bons ventos.......
(Junho 2004)
Foto: Leonardo Negrão

Assim é que é

Gostei do sentido de risco dos camaradas de profissão que lançaram o Sol.
Gostei da saudável reacção do Expresso, que respondeu muito bem ao desafio lançado pelo Sol.
Gosto que haja mais opções editoriais ao fim de semana.
Gosto que a imprensa se diversifique.
Gosto da concorrência entre jornais.
Gosto de ver os jornais aumentar as tiragens, num claro desmentido à alegação de que os portugueses se afastam cada vez mais da leitura.
Gosto que os consumidores da imprensa possam, através dela, ter acesso a bens complementares de qualidade, como a excelente série de filmes em DVD que o Expresso tem oferecido aos seus leitores.
Gosto dos preços razoáveis que estão a ser praticados pelos semanários ao sábado, o que só é possível pelo facto de haver mais títulos nas bancas.

Elas sobre elas

«Une femme est toujours humiliée du mépris qu'on montre pour son sexe: elle soufrirait peut-être moins d'une accusation personelle, car elle aurait l'éspérance de se justifier»
Madame Necker, nascida Suzanne Curchod de Nasse
em «Ce que les femmes disent des femmes», Americ=Edit, 1936.

Woman

A woman is beautiful
but
you have to swing
and swing and swing
and swing
like a handkerchief in the
wind

Jack Kerouac, em «Pomes All Sizes».

sábado, setembro 23, 2006

Frases únicas da literatura (2)

«- É curioso - disse Billie -mas sempre que um tipo se emborracha e quer casar comigo, percebo imediatamente que o cavalheiro gosta de outra pessoa».
Budd Schulberg, «O Que Faz Correr Sammy?»

A Christie o que é de Christie

Isto das citações é um terreno por vezes escorregadio. Há uma frase - bonita e falsa, como são muitas frases célebres - que costuma ser atribuída a Cesare Pavese e que é afinal de... Agatha Christie. A sério. Lá vem, na página 91 da Autobiografia (Edição Livros do Brasil) da velha senhora do crime - um dos livros que ando a ler. "Não devemos voltar a um lugar onde fomos felizes", assinalou a dama Agatha nesta obra, escrita em 1950.
A Cesare o que é de Cesare, a Christie o que é de Christie...

Postais blogosféricos

1. Um abraço de parabéns ao Pedro Mexia, pelo primeiro aniversário do seu excelente Estado Civil, um dos blogues mais apreciados nesta casa.
2. Mais duas ligações na nossa barra lateral, com as saudações da praxe. À Câmara Corporativa, do Miguel Abrantes, e ao recém-estreado Cinco Dias, que também promete ser polémico.
3. O André Moura e Cunha suspendeu o seu blogue. Tenho pena. Porque valia sempre a pena visitá-lo. Faço votos para que regresse em breve.

Gostei

Finalmente consegui ler o Sol, o novo semanário dirigido por José António Saraiva. E sabem uma coisa? Gostei.
Pois é. Também é verdade que não estava à espera de encontrar um Expresso 2, como, aposto, era a expectativa de muito boa gente. Não estava à espera de nada. Ia de mente aberta. É mais populista que o Expresso, já alguém o tinha dito, mas penso que essa característica até poderá ser uma vantagem. Agora, se a ideia é ser um Expresso 2, então ficou muito longe disso.
Gostei. À primeira vista. Numa primeira leitura. Vamos ver daqui para a frente. Já agora, aproveito para desejar a melhor das sortes às minhas queridas colegas Eunice Lourenço e Helena Pereira.

Adeus Verão, olá Outono

Sentir-me turista em Lisboa. Descer placidamente a Avenida, como um americano em Paris. Desaguar numa esplanada dos Restauradores, encomendar distraído uma tosta e uma cerveja enquanto espreito os jornais e faço horas para ir ver o filme de Nicholas Ray à Cinemateca. Clima ameno: 24 graus. Os pardais vêm ter comigo, pedindo umas migalhas da tosta que de bom grado partilho com eles. O sol brinca às escondidas com forasteiros de todos os idiomas sentados nas mesas em redor. Na revista do Expresso, Caetano Veloso confessa: "Só Portugal preenche um lugar dentro da minha alma."
Olho em volta: um cenário de doçura e harmonia. Nada disto vem relatado em nenhum telejornal: o que é bom não merece notícia. E fico a pensar em nós todos, portugueses. Somos um povo estranho: quase sentimos a obrigação de pedir desculpa por cada súbito instante de felicidade, seja em que estação do ano for. Como se fosse pecado ser feliz.

Blogues em revista

Abrupto: “Há casos em que a distinção entre 'sociedade civil' e mundo político é perversa e enganadora. Um deles, evidente como um enorme reclame de néon, é o do Compromisso Portugal. A iniciativa é política até ao tutano, traduzindo a politização do nosso mundo de gestores (e em menor grau de empresários, menos representados na reunião), mas afirma parar à porta da política, quer-se dizer da política partidária, mecanismo pelo qual nas democracias se conseguem os votos para governar." (José Pacheco Pereira)
Portugal dos Pequeninos: “Quem aterrasse em Portugal, ainda por cima com o engº Sócrates em Nova Iorque, podia julgar que o dr. António Carrapatoso era o chefe do governo português. Não houve órgão de 'comunicação social' que se prezasse que não desse voz à 'boa-nova' prometida pelos discípulos do prof. Karamba da Vodafone. O provincianismo é mesmo assim. Deslumbrado e, ele sim, irreformável." (João Gonçalves)
Kontratempos: “Discursando na Assembleia Geral da ONU, Hugo Chávez referiu-se a George W. Bush como 'o diabo'. O materialismo histórico já não é o que era.” (Tiago Barbosa Ribeiro)
Da Literatura: “A esquerda e a direita democráticas são adversárias, não são inimigas. É importante que se reconheçam e se digladiem de forma clara, para que nesse confronto não se percam apoios para os sectores radicais, para as margens, onde – aí sim – se albergam os inimigos da democracia." (João Paulo Sousa)
Miss Pearls: “Temos que chegar [a Cuba] antes que o capitalismo selvagem leve a banda larga livre, as televisões privadas, as netcabos, os jornais, carros posteriores a 1970, iogurtes, o leite pasteurizado, as radios, os ipods, o dvd, os cornflakes, as cervejas em lata, a Zara, a Victoria's Secret, o Mac Donalds, os roll on, a Fnac, os micro-ondas, os computadores, a Habitat, a Boots, os cartões de crédito, o código de barras, os toalhetes de limpar o pó e o shampoo de aloe vera.” (Isabel Goulão)
Incontinentes Verbais: “E magistrados do ministério público ou funcionários judiciais, quantos é que foram acusados [no caso do Envelope 9]? Ou será que os jornalistas tiveram acesso aos referidos documentos por simples magia!? Se o rídiculo matasse..." (Rui Castro)

A "cacha" do dia

Não sei se já alguém comentou a notícia dada por António Costa (o Editor de Economia, não o ministro) na edição de hoje do Sol. Escreve ele que o Governo e Mário Lino pretendem entregar - a quem ficar com a ANA depois da privatização - a decisão de localização do novo aeroporto. Só isto, o lavar de mãos depois de todos estes anos, estudos, discussões, tempo e dinheiro gastos já seria surpreendente.
Mas, na mesma notícia, ficamos a saber que uma decisão alternativa à Ota obrigaria os vencedores do concurso a começar do zero todo o projecto, sendo a possibilidade de escolha «apenas política» e não existindo portanto outra opção real.
Em primeiro lugar, isto não é verdade. Existem estudos feitos há anos e pormenorizados sobre a localização de Rio Frio, desde a altura em que ambos os lobbies se defrontaram sobre este tema. Em segundo, o «sacudir de água do capote» deixa outra pergunta no ar: Se não há escolha alternativa possível em tempo útil para o projecto, qual o problema em assumi-la? Parafraseando o bardo William: Há mais coisas, nesta notícia, do que sonha a nossa vã democracia.

Questão de identidade

Mas se ainda ontem queriamos ser todos finlandeses, qual é o problema de hoje um terço ter vontade de ser espanhol?

sexta-feira, setembro 22, 2006

Tempestade no Atlântico

Aquilo no Atlântico (ou «na», não sei, como é blogue e revista é assim a modos que andrógino) já está na fase da fractura exposta. A mim, o que me causa alguma perplexidade é que pessoas que defendem o «Não» no referendo, como o PPM, venham sempre com uma conversa parecida com a de «não sou capaz de condenar qualquer mulher».
Isso não faz, é evidente, qualquer sentido. Se há uma lei, quem a transgride é punido. A letra da lei não é propriamente um aviso às criancinhas do género «se não comes a sopa levo-te à Intersindical». Neste caso, quem não come a sopa é pelo menos obrigada a assistir a um plenário.
Na fase em que visitei os rapazes, eles já discutiam o que querem afinal significar as palavras: «Esta para mim quer dizer isto e para ti é sinónimo daquilo». O que, já se sabe, é o primeiro passo para chegar a lado nenhum. É engraçado ficarmos de fora e vê-los a dar saudáveis cabeçadas em círculos sem sair do lugar mas, a certa altura, cansa um bocado. É como o wrestling.

Mexilhão

Os jornalistas do 24 Horas que cumpriram o seu dever - que, para quem não sabe, é o de informar - foram acusados formalmente pelo Ministério Público no chamado caso do Envelope 9. Mas "não foram recolhidos indícios da prática de crime ou de qualquer responsabilidade disciplinar imputável a magistrado, oficial de justiça ou funcionário da Polícia Judiciária, em relação com a obtenção, depósito e manutenção no denominado processo Casa Pia, de ficheiros contidos nas disquetes guardadas no "Envelope 9". É espantoso.
Mas será certamente ainda pior, dizem-me, com a aprovação do novo Estatuto do Jornalista. Que venha a Ordem e rápido. O Corta-Fitas está solidário com os dois jornalistas do tablóide e acha que este é daqueles assuntos que merece petições e abaixo-assinados.

O continente das esperanças frustradas

Lula, afogado no miserável escândalo do "mensalão", patinou entretanto no motim dos presidiários de São Paulo, que manchará por muitos anos a imagem do Brasil no mundo, e vê-se agora envolvido numa alegada conspiração ilegal para atingir o seu principal rival à eleição presidencial de 1 de Outubro. Hugo Chávez, demagogo insaciável, transforma a Venezuela em sede regional do mais irresponsável dos populismos. Evo Morales, instigado pelo agonizante ditador Castro, oferece novos horizontes de miséria à Bolívia, como se a que havia até agora não bastasse já. A América Latina é bem "o continente das esperanças frustradas" de que fala Mario Vargas Llosa. Com a luz cada vez mais ténue ao fundo do túnel.

Descobertas

O Miguel Real também já está na blogosfera. Que grande contratação do Prazeres Minúsculos.

Assino por baixo

Subscrevo o apelo do Carlos Abreu Amorim: "Façam blogues. Escrevam. Debatam. Com aquela habilidade que todos vos reconhecem, defendam o aumento do peso do Estado. Façam a apologia da troca de seringas nas escolas primárias. Desculpem o Hamas. Citem o Chavez. Compreendam o Irão. Arremetam contra Israel. Exaltem a liberdade dos sírios. Riam-se dos americanos. Mas dêem-nos alguma luta. A blogosfera agradece."

Zé Diogo Quintela, a sério!

Por estas e por outras é que não leio jornais desportivos.

Guerra ou guerrilha?

O dia de amanhã, ou o fim de semana, é importante para o futuro da imprensa em Portugal. A contenda entre o Expresso e o Sol estará ao rubro, visto que o semanário de Balsemão irá imprimir 200 mil exemplares e o de Saraiva 210 mil. Só estes dois jornais irão pôr nas bancas 410 mil jornais. O que é obra. Há muito tempo que não se via um fenómeno destes em Portugal, país que se diz ser de pouco poder de compra e fraco de leituras. Mas esta guerra não pode ser espuma, tem que ser revitalizadora. Tem de ajudar a conquistar e a fidelizar leitores nestes e noutros jornais. Se isso acontecer, tudo isto não será espúrio e fora do normal. Teremos mais e melhor imprensa. Mais e melhor cultura. Mais e melhor País.

É o choque, é o choque


Recebida de autor desconhecido mas com apurado sentido de humor.

Desta vez, a brincadeira acabou mal

Richard Hammond é um dos três apresentadores do Top Gear, um dos melhores e mais divertidos programas televisivos de todo o mundo. Anteontem, a brincadeira acabou mal. Espetou-se a 500 Km/h

Os cinco na Terra do Nunca

O Daniel Oliveira diz que os conhece de ginjeira. Eu quase diria que também. É novo na blogocoisa, chama-se cinco dias e promete vir a ser uma Disneylândia da esquerda. Mal começou já anda para lá Bush, as FARC e mais não sei quê porque não tive pachorra para ler e já não vou para novo.
Dou-lhes, no entanto, os parabéns pelo template que é bem esgalhado e que nós aqui já deviamos ter também. Assim uma roupinha nova estilo fatinho da Labrador, com opção Stivali para as senhoras. O que acham?
Giro hem? O meu post e o do FAL foram postos ao mesmo tempo. Ele, claro, é muito mais gentleman.

Dias não são dias

Quem andava preocupado (o que não é, manifestamente, o meu caso) com a ausência da Joana Amaral Dias do Bicho Carpinteiro, pode agora encontrá-la no Cinco Dias. Pelo que percebi, fica a meio caminho entre um blogue e um site de opinião/intervenção. É de ler e de ver (o webdesign é óptimo), porque o confronto e variedade de ideias são o sal - e a pimenta - da democracia.

Demarcação

Apesar da minha sincera posta em baixo, obviamente, eu considero que a iniciativa Compromisso Portugal é do maior interesse para o debate de ideias e procura da viabilização do meu país. Com mais ou menos defeitos, a nossa classe empresarial possuirá por certo propostas tanto ou mais pertinentes e realistas para debate quanto a nossa estafada classe politica. O “Estado Providência” faliu, o circo está a acabar, é tempo de trabalhar e agir. Não sei quantos políticos conhecerão o significado e emergência destas palavras. A maioria dos empresários sabe.

A ler

1. Este artigo de Arnaldo Jabor sobre a situação política no Brasil, a que cheguei via O Insurgente.
2. O que o Eduardo Pitta escreve aqui sobre a repressão de que está a ser vítima Elif Shafak, uma das melhores escritoras contemporâneas. Perante o silêncio das bempensâncias do costume.
3. A opinião de Pacheco Pereira sobre a polémica em torno do discurso do Papa, na edição de ontem do Público (ligação indisponível): "A conferência do Papa é um dos textos mais tolerantes que algum Papa fez até hoje, e talvez tenha sido por isso mesmo que foi atacada."
4. O texto integral desse discurso pode ser lido aqui.

As meninas dançam?

Soube bem hoje ver o destaque e o cuidado tanto do 6a no DN como do Mil Folhas no Público, antecipando-se ao centenário do nascimento de Dimitri Shostakovitch na próxima segunda-feira (Sim, há quem escreva com cê).
Aqui fica uma valsinha. Não precisam de agradecer, eu sou assim, gosto de partilhar.
E ainda acrescento que a minha quase prima Beatriz Batarda ("quase" porque a mãe dela foi casada com o meu tio-avô) e Inês de Medeiros estarão no CCB dia 27 para leituras de poemas de Anna Akhmatova e Marina Tsvetaieva. A minha alma russa lá tentará estar.

Está na altura de renegociar o salário

«Vários estudos demonstram que as pessoas mais belas são, social e profissionalmente, mais bem sucedidas do que as desengraçadas».
Luís Aguiar-Conraria, na Dia D

Música do coração

Estreou ontem no São Luiz e fica em cena até 26 de Novembro, de quarta a domingo. O Nuno Costa Santos, felizmente regressado ao mondo bloggo com o Melancómico é o autor da história e dos diálogos falados que estabelecem a ligação entre as canções, com letras de João Monge, e a música de Manuel Paulo. A encenação é de Adriano Luz e actores e actrizes são 16, com nomes como Diogo Infante e Lia Gama. Chama-se «O Assobio da Cobra» e já tenho garantidos dois bilhetes. Nina, nina.

Apesar de tudo

Apesar de tudo o que já aqui se disse e escreveu, entendo que reflexões sobre o estado do País, como as que o Compromisso Portugal vem fazendo, são de grande utilidade. Desde logo porque acrescentam vários pontos à discussão, fazem avançar alternativas, mesmo que muitas delas não sejam concretizáveis a curto, a médio ou a longo prazo. É a vida.
Apesar de tudo, também consigo distinguir umas propostas das outras. Desde logo, acho que a redução gradual, em cinco anos, da taxa de IRC, que é hoje em dia de 25%, é uma boa proposta. O autor foi Alexandre Relvas, que foi director de campanha de Cavaco Silva nas últimas presidenciais. Relvas garantiu que a descida seria um “factor diferenciador de atracção de investimento para o País” e afiançou que o ideal era que a taxa se situasse entre os 10 a 12,5%. Talvez se propostas como esta fossem aceites e postas em prática o País não estivesse como está em termos de investimento e estrangulamento financeiro das empresas. Talvez a GM não fechasse a fábrica da Azambuja - que tanto trabalho deu ao meu avô fundar há mais de 40 anos -, depois do Governo (em especial Manuel Pinho) andar semanas a trocar o passo e em negociações que saíram completamente furadas. Porque a decisão estava tomada há muito. Porque o País deixou de ser competitivo há muitos anos.
Apesar de tudo, não foi só Relvas que teve bom senso. Repare-se nesta frase de José Maria Ricciardi: "A liberalização dos despedimentos, num país com uma classe empresarial como esta, era um risco que eu não correria".
Apesar de tudo, esta segunda convenção do Compromisso Portugal valeu também pelos nomes estrangeiros que conseguiu trazer. Sobretudo Alan Dukes, antigo ministro das Finanças irlandês, que explicou o milagre irlandês, com a aposta na inovação e na educação.
Apesar de tudo, foi bom de ver que José Sócrates não esteve sequer interessado em receber o documento provocatório do Compromisso Portugal. Mas antes das últimas eleições agradeceu e esfregou as mãos de contente quando este grupo de economistas e gestores considerou os programas do PS e do PSD como praticamente iguais. Na altura, apesar de a maior parte deles ser do centro-direita, escreveu-se que havia boas propostas nos dois programas. O que deu muito jeito a Sócrates, para seduzir o eleitorado do centro e adensar a bruma. Aliás, parece que aquela análise tinha algo de premonitória, os pactos estão aí.
Apesar de tudo, o Correio da Manhã inseriu o tema nas páginas da secção de política e não de economia.

(imagem: "Glória dos Santos")