quarta-feira, setembro 27, 2006

Pai tirano (finale)

Caro João Villalobos:

Não pretendo dar receitas sobre educação a ninguém. Mas justifico-me: nessa matéria, em minha casa, cada decisão é tomada em liberdade, a seu tempo, e tendo em conta uma realidade que não é estática. São opções feitas em consciência e da exclusiva responsabilidade da minha mulher e minha, tendo como fim único, o bem das crianças.
Sem querer entrar na discussão sobre o valor (e valores) daqueles conteúdos - Morangos com Açúcar e quejandos , do que conheço deste novo género de novelas, é que chegam a durar quase três horas seguidas, de manhã, à tarde e à noite; numa fórmula alienante que de facto prende as crianças, principalmente as mais pequenas. Acontece que elas têm que estudar, por exemplo, e a Natália, a nossa leal empregada, tem algumas limitações no campo da pedagogia. Assim, considero o bloqueio de canais uma bela ferramenta de controlo parental à distancia.
Assim como o João, eu também sempre “li tudo o que apanhei pela frente” (a minha mulher igualmente, o que faz da minha casa um pequeno mundo de livros). Isso é diferente. E os meus miúdos (refiro-me evidentemente aos mais velhos, com 14 e 16 anos) sabem que são livres de ler (quase) tudo o que apanhem pela frente. Fico muito contente até. E desde que acompanhados, também podem ver (quase) todo o cinema. Acho que são crianças livres porque não são alienadas. Na literatura, cinema, televisão ou internet, só reprimimos a estupidez.
Aliás, em nossa casa vigora uma saudável meritocracia de que me orgulho. Assim saibam os miúdos gerir a liberdade que têm, e tudo corre bem. Dá trabalho mas preferimos assim.
De resto, caro João, parece-me cruel deixar uma criança de cinco anos entregue à sua "pouco treinada" vontade. A ser “educada” pela televisão (os outros já não vão nessa, não têm pachorra). Aquilo (os Morangos e a Floribela) está feito de forma a prender os miúdos, e os mais pequenos são as vítimas mais fáceis. Prefiro que a Carolina termine a tarde a meter-se com os irmãos mais velhos, a pintar, a escrever palavras no frigorífico com as letrinhas coloridas. Ou, num dia de sorte, comer um "yogurt surpresa" na cozinha a ouvir a Natália a contar-lhe histórias enquanto engoma, enquanto a mãe não chega.

Com amizade,