segunda-feira, outubro 22, 2007

Sócrates nem parecia Sócrates

José Sócrates rematou com um plebeíssimo “porreiro, pá!” o seu papel de anfitrião na bem sucedida cimeira de Lisboa, como o Francisco referiu aqui antes das manchetes que imortalizaram a frase em letras garrafais. Sócrates nem parecia Sócrates. Quer dizer: ao soltar a vulgaríssima e banalíssima expressão que milhões de portugueses proferem diariamente – nas mais diversas paragens do globo – como se fosse um cidadão comum, o primeiro-ministro revelou enfim um traço humano na sua personalidade toda moldada pelo marketing político. Mas isto só sucedeu porque supunha que os microfones postos à sua frente já estavam desligados. Bastaria a suspeita de que a gravação estaria a correr (como de facto estava) para logo a pose ficar hirta, a mão não trair o gesto mil vezes estudado e o sorriso surgir convenientemente plastificado em dose anti-rugas. Ou seja, para que Sócrates ficasse igual a Sócrates – melhor dizendo, igual à sua imagem pública.
Foi preferível assim. Foi preferível que Sócrates nem parecesse Sócrates. Melhor para nós, que descobrimos enfim nele um traço de identidade com qualquer cidadão não-mediático. E melhor também para ele: por momentos perdeu o perfil de autómato. O que só pode fazer-lhe bem.

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