terça-feira, junho 12, 2007

Por detrás das muralhas

Eduardo Pitta é poeta - sete livros publicados e uma antologia – mas também ensaísta e diarista. É crítico literário do Público, mas ainda o principal autor do blogue Da Literatura . Eduardo Pitta é tudo isto e, acrescento porque vem ao caso, homossexual. Gay, queer, ou lá o que quiserem chamar-lhe.
Se isso é para aqui trazido é tão-somente porque, quer este «Cidade Proibida» quer a sua anterior trilogia de contos, «Persona» (agora reeditada pela QuidNovi), lidam com as vidas e os conflitos entre homens que preferem homens e as regras e constrangimentos sociais. No caso de «Persona», o cenário é a África da guerra colonial. Neste «Cidade Proibida», é essencialmente a Lisboa actual habitada por uma alta e ilustrada burguesia.
Podemos, pois, ler a obra de Pitta acreditando que existe a chamada «literatura de género». Ou optar pela convicção de que tal coisa, a existir, não invalida que haja boa ou a má literatura, independentemente da parceria que preferimos na cama.
Numa tessitura que reúne mais de 40 personagens, «Cidade Proibida» é uma história com muitas histórias lá dentro. Cada uma das figuras carrega com ela um passado, um meio, uma educação que as agrupa em famílias de sangue ou de afinidade, núcleos irredutíveis e protegidos por densas muralhas. Delas, cada uma só sai para a amálgama ocasional e democrática do sexo, anónimo ou quase. Já o amor, esse acaba por não vencer. E, quando o romance termina, Rupert e Martim já não estão juntos, afastados que foram pelas suas diferenças culturais e sociais, mais fortes do que a relação que os unia. Com um peso exagerado dos estrangeirismos compensado por um conhecimento profundo dos hábitos e costumes do meio que retrata, Eduardo Pitta não condescende com sentimentalismos ou redondilhas. O sexo é apresentado a cru, os tiques mostrados sem contemplação, a História portuguesa recente mencionada sem pruridos ou filtros de boa consciência. Por tudo isto, obra «de género» ou não, «Cidade Proibida» é um romance igual a poucos. Texto a publicar na próxima revista Blitz.

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