Coreia do Norte (II)
Milhares de pessoas avançavam, nas estradas vazias, na noite, a caminho de pequenas fabriquetas e oficinas. Na loja (ao estilo de grandes armazéns soviéticos) as mulheres tinham a possibilidade de usar um único modelo de vestido elegante (revista Burda, anos 50, duas cores à escolha); no centro da cidade, erguia-se uma espécie de pirâmide gigantesca (seria o maior edifício da Ásia); aproximei-me, num impulso irresponsável, passei os guardas, que me olharam siderados, e vi por segundos, antes que chegassem os polícias (estavam em pânico) o imenso estaleiro da obra: parecia a recriação das pirâmides de Gizé, numa imitação asiática de Cecil B. de Mille. Um formigueiro humano, para construir um penedo que não servia para nada, pois para aquele hotel não havia turistas.
Na Coreia do Norte, a História era uma obscura sucessão de eventos confusos, até ter surgido Kim Il-Sung (agora, também o seu herdeiro e actual líder, Kim Jong-Il), o sol na Terra. Ele era o autor de todos os desenvolvimentos, descobertas e avanços da Humanidade, o maior génio vivo, de facto o único génio. Em Pyongyang ainda existe um enorme monumento à ideia Ju-Che, um dos três pilares daquele regime alucinado. Trata-se de um conceito misterioso, de tipo chauvinista, que julgo vir de alguma noção antiga, transformada em obediência cega. Outro símbolo é um cavalo alado, esse sem dúvida com origem na tradição coreana antiga. Finalmente, o líder, cuja infinita sabedoria não pode ser posta em causa. Em resumo, tabula rasa do passado e o presente transformado numa espécie de parque temático onde a ideologia era uma amálgama de autoridade e resignação.
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