Uma cidade roída pela solidão
Nos longos dias de Verão, quando muitos dos que aqui trabalham vão de férias, percebemos melhor como Lisboa está a transformar-se numa cidade povoada por velhos. Os jovens são cada vez mais empurrados para a periferia, tornando o centro da capital um domínio praticamente exclusivo de gente idosa, que quase nem sai à rua e se limita a espreitar o mundo pelo ecrã da televisão ou por um olhar furtivo à janela. Entre os recenseamentos de 1981 e 2001, Lisboa perdeu 20 por cento da sua população fixa. Há ruas onde não mora ninguém. No Rossio, conservam-se cinco residentes – o mais novo dos quais já septuagenário. E tudo isto, que devia ser tema de intenso debate público, parece não espantar ninguém. “On s’habitue, c’est tout”, cantava Jacques Brel numa das suas mais belas canções. É isso mesmo: vamo-nos habituando à invasão do insólito no nosso quotidiano e já não estranhamos rigorosamente nada.