Uma realidade inconveniente
A dignidade e qualidade de vida na velhice é uma questão sobremaneira pertinente nos tempos que atravessamos. E quando aqui refiro "velhotes", não falo do dinâmico e promissor “segmento de mercado” em gozo de generosas reformas antecipadas. Não me refiro a essa nova classe etária à qual se apelidou de “sénior”, com que se ilustra graficamente os anúncios de cruzeiros, viagra ou fraldas descartáveis. Refiro-me aos velhos-relhos, débeis e alquebrados, para quem até um mediano poder de compra não consegue disfarçar o sofrimento físico e psicológico ou o literal abandono a que são votados.
Bem sei que estes são os danos colaterais do progresso, do desagregar dos ancestrais modelos de organização social, das comunidades familiares alargadas, em paralelo com o aumento exponencial da esperança de vida - uma mistura explosiva. Esta “nova ordem” potenciou a formação de silenciosos exércitos de velhos dependentes, humilhados e rejeitados pela implacável vida “moderna”: uma adolescentocracia com as suas referências hedonistas, uma sociedade movida pelas aparências e pelo individualismo desregrado, que favorece o predador mais hábil, numa lógica antagónica à realidade e à estética da velhice.
Bem sei que estes são os danos colaterais do progresso, do desagregar dos ancestrais modelos de organização social, das comunidades familiares alargadas, em paralelo com o aumento exponencial da esperança de vida - uma mistura explosiva. Esta “nova ordem” potenciou a formação de silenciosos exércitos de velhos dependentes, humilhados e rejeitados pela implacável vida “moderna”: uma adolescentocracia com as suas referências hedonistas, uma sociedade movida pelas aparências e pelo individualismo desregrado, que favorece o predador mais hábil, numa lógica antagónica à realidade e à estética da velhice.
Com um modelo de “família” reduzido à sua expressão mínima - quantas vezes transformada numa frágil e deprimente estrutura monoparental - a sufocar em utilitários favos suburbanos, pouca capacidade ou disposição lhe sobra para acompanhar os seus progenitores ou parentes na sua sensível e dolorosa etapa final.
O problema, longe de ser abstracto e teórico, é bem concreto e dramático, uma fatalidade que me tem saltado à vista com progressiva frequência nos últimos anos. Quando visito a minha mãe doente, ali para os lados da Almirante Reis, naquelas ruas da cidade arruinada, deparo-me com a sua população que tem a idade dos vetustos prédios em que habita. E ponho-me a pensar quem cuidará daquela gente perdida, que definitivamente já corre noutro campeonato...
Recentemente, numa incursão feita pelas Urgências do Hospital de S. José, impressionei-me com o panorama das dezenas de homens e mulheres, de olhar vago, doentes e desamparados. E quão diferente são aqueles seres, do mundo que nos vendem nos media, feito de modelos de juventude e eficácia, beleza e sedução... mas apesar disso retocados pelo fotoshop. E, para alem da imagem, quem conseguirá verdadeiramente colocar-se nos seus sapatos e perscrutar os seus sentimentos e anseios?
Sei de muitas instituições e pessoas que trabalham em regime de voluntariado perto desta população. Sei do papel decisivo das paróquias e das suas comunidades nesta urgente intervenção solidária. Mas também reconheço que o assunto é tabu, que ninguém o quer enfrentar, mas que urge ser amplamente debatido e denunciado. Nem que seja porque este problema social se adensará radicalmente nas próximas décadas, e porque nossa geração está nesse caminho, ali logo depois da contracurva, numa marcha constante e imparável.
O problema, longe de ser abstracto e teórico, é bem concreto e dramático, uma fatalidade que me tem saltado à vista com progressiva frequência nos últimos anos. Quando visito a minha mãe doente, ali para os lados da Almirante Reis, naquelas ruas da cidade arruinada, deparo-me com a sua população que tem a idade dos vetustos prédios em que habita. E ponho-me a pensar quem cuidará daquela gente perdida, que definitivamente já corre noutro campeonato...
Recentemente, numa incursão feita pelas Urgências do Hospital de S. José, impressionei-me com o panorama das dezenas de homens e mulheres, de olhar vago, doentes e desamparados. E quão diferente são aqueles seres, do mundo que nos vendem nos media, feito de modelos de juventude e eficácia, beleza e sedução... mas apesar disso retocados pelo fotoshop. E, para alem da imagem, quem conseguirá verdadeiramente colocar-se nos seus sapatos e perscrutar os seus sentimentos e anseios?
Sei de muitas instituições e pessoas que trabalham em regime de voluntariado perto desta população. Sei do papel decisivo das paróquias e das suas comunidades nesta urgente intervenção solidária. Mas também reconheço que o assunto é tabu, que ninguém o quer enfrentar, mas que urge ser amplamente debatido e denunciado. Nem que seja porque este problema social se adensará radicalmente nas próximas décadas, e porque nossa geração está nesse caminho, ali logo depois da contracurva, numa marcha constante e imparável.
Etiquetas: Crónicas, Quotidiano