domingo, novembro 25, 2007

Cinema Nostalgia (18)

Os dois no carro. Ela tensa e desconfiada, ele pragmático e demasiado descontraído. Têm pela frente uma longa viagem e nós, em total dissonância com o par, instalamo-nos no assento de trás, a pressentir que o que vem a seguir só pode ser imperdível. E é.
Um homem e uma mulher podem ser amigos, ou o sexo aparece sempre no meio? – esta é uma das questões provocatórias que saltam, do diálogo fabuloso que se desenrola entre os dois, para a nossa agenda. Podem? (Quando saí do cinema tratei logo de averiguar. Os resultados, confesso, ainda hoje me dão que pensar. Mas isso é outra conversa...)
Presos cada um às suas idiossincrasias, Meg Ryan e Billy Crystal lançam-se numa disputa que os transcende. O que se desenha ali, desde o começo, é uma guerra dos sexos, mas ao contrário das muitas disputas de género que já vimos no cinema esta é sustentada por um guião brilhante, servida por desempenhos inesquecíveis e sublinhada a cores por uma banda sonora de luxo.
Um Amor Inevitável
(no original When Harry Met Sally), dirigido por Rob Reiner e com argumento de Norah Ephron (que recebeu uma nomeação para o Óscar), tem a capacidade rara de nos prender ao ecrã desde os primeiros minutos porque é uma comédia inteligente e manipuladora. Inteligente porque prescinde desde logo do modelo baseado em personagens estereotipadas a que nos habituámos nesta categoria de filmes. E manipuladora porque ao sermos surpreendidos por um Harry e uma Sally (as personagens de Crystal e Ryan) credíveis, envolvemo-nos mais do que é suposto acontecer quando se trata, afinal, de assistir a uma comédia.
Porque é muito real, este par não permanece estático. Vemo-lo evoluir, assim como a relação que vai construindo ao arrepio da lógica e da sua própria vontade, como tantas vezes acontece na nossa vida.
Cada um investido das razões que naturalmente os qualificam como oponente do outro, Harry e Sally são também a metáfora do que pode ser, sobretudo nos tempos que correm, a relação entre um homem e uma mulher. Da luta à rendição, desenrola-se um novelo feito de conflitos de interesses, interferências hormonais despropositadas - e mesmo inconvenientes - , curiosidade, desconfiança e admiração.
Quando, na cena final do filme, os protagonistas assumem, enfim, o romance, o nosso sorriso flutua entre a condescendência e a ternura, como quem pensa “que parvos!” E no fundo, estamos, provavelmente a pensar em nós: orgulhosos, complicados, patéticos e divertidos, donos da metade de uma verdade que para ter graça precisa mesmo de encaixar na outra.
Um Amor Inevitável foi, para mim, um amor à primeira vista. E em vinte anos não envelheceu. Continua irresistível!

Nota: na foto a célebre cena do falso orgasmo de Meg Ryan, aliás Sally Albright

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