quinta-feira, abril 19, 2007

Trajes sem monges

(...) Basta uma rápida visita ao Museu do Trajo para ver a riqueza que temos e desprezamos. Quase todas as profissões têm uma indumentária própria, castiça sem ser boçal e garrida sem ser berrante. Com um bocadinho de jeito, adaptam-se as fardas de misteres já caídos em desuso para vestir novas profissões. A do aguadeiro, por exemplo, dá perfeitamente para delegados de propaganda médica. Para quem escreve, existe o trajo típico de amanuense ou do copista, Quem fala pejorativamente em mangas de alpaca é porque nunca apalpou uma alpaca, não fazendo ideia do fofinho que pode ser. E para todas as que cantam, como não podia deixar de ser, xailes de merino.
Vestidos como os camponeses e operários que somos e engalanados, em dias de festa com os trajos das nossas terras, deixaríamos de andar com versões rascas de roupas dos ricos e passaríamos a ser, facilmente, os mais bem vestidos da Europa.
Assim é que não podemos continuar, desculpem lá.
Miguel Esteves Cardoso - "Os bons hábitos dos monges", Única Expresso, 6 Maio 2006, pag. 16