Os portugueses são uns mentirosos (II)
Outro passatempo preferido dos portugueses é exprimir uma intenção de voto que não é, digamos, exactamente a sua. O português sente-se confortável quando se imagina transformado em dado estatístico numa determinada maioria sociológica. Mesmo que, no seu íntimo, esteja nos antípodas dessa maioria, que pode ser real ou fabricada por uma empresa de sondagens dotada de menor espírito científico.
É, assim, sem surpresa que escutamos à nossa volta multiplicarem-se as declarações de intenções apropriadas aos grupos socioprofissionais dominantes. Um exemplo: entre os jornalistas, quando era moda ser anti-Cavaco Silva (moda rapidamente em desuso nos dias que correm), perguntava-se na generalidade das redacções se alguém tencionava votar nele e, com a provável excepção do Povo Livre, a derrota era esmagadora. Ainda há um ano, nas presidenciais, quem ouvisse a generalidade dos jornalistas “políticos” exprimir uma intenção de voto verificava facilmente que o grande vencedor da contenda seria... Mário Soares, “campeão” à esquerda nas sondagens mas que no final recolheu apenas 14 por cento de votos, atrás de Cavaco e de Manuel Alegre. Interrogo-me ainda hoje se grande parte dos jornalistas que garantiam alto e bom som irem votar Soares “contra aquele gajo que nem ao menos saber comer bolo-rei” estariam afinal tão desfasados da maioria dos eleitores no segredo da cabina de voto...
Idem, quanto aos referendos. Em 1998, questionei várias pessoas das minhas relações se tencionavam participar no referendo ao aborto. Claro que sim – resposta unânime. Ninguém cometeria a suprema heresia laica e republicana de permanecer estendido na toalha de praia à hora a que devia estar a cumprir o “dever cívico” que a Constituição aconselha sem impor. Abstencionista militante? Nem um para amostra. Concluí depois estar muito desfasado da realidade, na medida em que não não conheço pessoalmente um só dos 70 por cento de eleitores que nem se deram ao trabalho de passar perto de um local de voto naquele dia.
Receio que a história se repita. À minha volta, já escuto promessas veementes de participação eleitoral no próximo domingo. “Desta vez vou lá”, garantem até as bocas já esquecidas de que em 1998 também juraram (em vão) que lá iriam. De uma delas ouvi há dias a confissão de ter votado Cavaco em Janeiro de 2006 – afinal faz parte da “maioria presidencial”, a mesma que o actual Chefe do Estado garantiu ter-se dissolvido na noite da eleição. E eu a imaginar que à época a tinha ouvido fazer reiterada profissão de fé soarista...
Mente-se muito em Portugal. A respeito de dinheiro, a respeito de sexo. Mas sobretudo a respeito do voto – o grande tabu da nossa vida colectiva.
É, assim, sem surpresa que escutamos à nossa volta multiplicarem-se as declarações de intenções apropriadas aos grupos socioprofissionais dominantes. Um exemplo: entre os jornalistas, quando era moda ser anti-Cavaco Silva (moda rapidamente em desuso nos dias que correm), perguntava-se na generalidade das redacções se alguém tencionava votar nele e, com a provável excepção do Povo Livre, a derrota era esmagadora. Ainda há um ano, nas presidenciais, quem ouvisse a generalidade dos jornalistas “políticos” exprimir uma intenção de voto verificava facilmente que o grande vencedor da contenda seria... Mário Soares, “campeão” à esquerda nas sondagens mas que no final recolheu apenas 14 por cento de votos, atrás de Cavaco e de Manuel Alegre. Interrogo-me ainda hoje se grande parte dos jornalistas que garantiam alto e bom som irem votar Soares “contra aquele gajo que nem ao menos saber comer bolo-rei” estariam afinal tão desfasados da maioria dos eleitores no segredo da cabina de voto...
Idem, quanto aos referendos. Em 1998, questionei várias pessoas das minhas relações se tencionavam participar no referendo ao aborto. Claro que sim – resposta unânime. Ninguém cometeria a suprema heresia laica e republicana de permanecer estendido na toalha de praia à hora a que devia estar a cumprir o “dever cívico” que a Constituição aconselha sem impor. Abstencionista militante? Nem um para amostra. Concluí depois estar muito desfasado da realidade, na medida em que não não conheço pessoalmente um só dos 70 por cento de eleitores que nem se deram ao trabalho de passar perto de um local de voto naquele dia.
Receio que a história se repita. À minha volta, já escuto promessas veementes de participação eleitoral no próximo domingo. “Desta vez vou lá”, garantem até as bocas já esquecidas de que em 1998 também juraram (em vão) que lá iriam. De uma delas ouvi há dias a confissão de ter votado Cavaco em Janeiro de 2006 – afinal faz parte da “maioria presidencial”, a mesma que o actual Chefe do Estado garantiu ter-se dissolvido na noite da eleição. E eu a imaginar que à época a tinha ouvido fazer reiterada profissão de fé soarista...
Mente-se muito em Portugal. A respeito de dinheiro, a respeito de sexo. Mas sobretudo a respeito do voto – o grande tabu da nossa vida colectiva.