quinta-feira, fevereiro 08, 2007

Consequências de uma vitória do "sim"

1. José Sócrates - Irá sair muito reforçado politicamente. Só quem anda a dormir pode pensar que o primeiro-ministro não lucra com uma vitória do "sim". Ao contrário de António Guterres, que, por convicção e contradição íntima, não se envolveu na campanha, Sócrates participou e com maior ou menor jeito fez passar a sua mensagem. Mais: envolveu o Governo e o partido numa campanha desta natureza, com vários ministros e deputados a aparecerem em acções de esclarecimento.
2. PSD - Não se sai nada bem. Marques Mendes fez o que Marcelo tinha feito em 1998: deu liberdade de voto aos seus militantes, mas acabou por envolver o partido, pois surgiu em várias acções de campanha como seu líder e não a título individual. Ficou também demonstrado o que vale no terreno. Mendes apareceu tarde, deu o dito por não dito, e deixou que a corrente passasse. Na noite de domingo, como se de eleições se tratassem, os holofotes estarão virados para a São Caetano à Lapa.
3. CDS - Ao contrário do que fez Paulo Portas em 1998, a performance dos democratas-cristãos nesta campanha deixou muito a desejar. O partido, os seus dirigentes, os deputados, não se viram. Se estavam lá, ninguém lhes prestou atenção. José Ribeiro e Castro esforçou-se e palmilhou o País. Como um homem só.
4. "Não" - O combate mais vigoroso da parte do "não" surgiu pela mão de Marcelo Rebelo de Sousa, das associações de apoio à vida, dos movimentos de independentes e da blogosfera, uma novidade em relação a 98. Todos estes podem estar orgulhosos do seu trabalho, empenharam-se em nome de convicções e de valores. No domingo, independentemente dos resultados, não serão perdedores. São antes uma chama já acesa para outros voos. Na prática, demonstraram a inutilidade de algumas forças partidárias e dos seus respectivos dirigentes.
5. Igreja - Perde muito com a vitória do "sim", até porque fica a sensação de que poderia ter feito mais e melhor. Com a aprovação da alteração à lei em referendo, o País fica mais laico por obra e graça de um senhor chamado José Sócrates. A seguir, quase de certeza na próxima legislatura, o primeiro-ministro irá anunciar outras revoluções "estruturantes". Teme-se o pior.
6. Comunicação social - Depois desta campanha nada será como dantes. A Internet, a blogosfera, os vídeos no You Tube, as mensagens para telemóveis de terceira geração, vieram trazer outra dinâmica ao espaço informativo. E demonstraram que a política ainda pode ser atractiva e que, sobretudo, pode fugir à alçada dos políticos e das suas máquinas partidárias.
7. Serviço Nacional de Saúde - Já em péssimo estado e a prestar um serviço abaixo dos mínimos - basta para isso passar uns meses a ir quase todos os dias a hospitais para ver que não há capacidade para acolher quem queira ir fazer IVGs em condições -, vai ficar sobrelotado, endividado e não poderá dar uma resposta adequada a todas as mulheres que queiram acabar com uma gravidez indesejada. A lei, se não for complementada por outras medidas, diplomas ou directivas das direcções regionais de Saúde, irá desajudar, em vez de ajudar como querem os responsáveis políticos que avançaram com a proposta. Não há aconselhamento, acompanhamento psicológico, investigação sobre as reais razões que levam essas mulheres a procurar um "estabelecimento público autorizado" para fazer um aborto. Não será dada a alternativa da vida a quem procurar um desses "estabelecimentos". Não será dado um tempo para pensar, para reflectir. Muitas usarão o aborto no SNS como método contraceptivo, sem limites.

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