Há sempre alguém que diz não
Aos poucos, a máscara de Jerónimo de Sousa vai caindo: por detrás da aparente bonomia, surge o autocrata que o seu antecessor, Carlos Carvalhas, nunca soube ou nunca quis ser. Depois do saneamento de que foi vítima o presidente da Câmara de Setúbal, outrora considerado autarca modelo dos comunistas, desta vez o PCP deu ordem de despedimento, também sem pré-aviso, a Luísa Mesquita, uma das suas melhores deputadas. Tanto Carlos como Luísa têm um pequeno defeito aos olhos dos apparatchiks da Soeiro Pereira Gomes: gostam de pensar pela sua própria cabeça. O ex-autarca setubalense cometeu até a suprema heresia de assinar um comunicado de militantes que apelava ao debate interno. Luísa Mesquita não foi tão longe, mas estava há muito identificada com a corrente renovadora, que se recusa a comportar como se o muro de Berlim ainda existisse e o "centralismo democrático" definido por Lenine fosse o último grito da moda nos figurinos partidários. Perante a ordem de despejo agora recebida no Parlamento, teve a dignidade de recusar, garantindo que permanecerá em São Bento: quem a elegeu foram os portugueses e não os burocratas sem rosto que a querem ver pelas costas. Nisto, esteve melhor do que Carlos de Sousa, que obedeceu à guia de marcha partidária, renegando o mandato directo que recebeu dos eleitores de Setúbal. Fez mal.
Luísa Mesquita teve uma atitude diferente. Fez bem. Felizmente - até no PCP - há sempre alguém que diz não.