segunda-feira, novembro 20, 2006

Esquerda-direita



É muito interessante, o desabafo do Duarte, aqui em baixo, no post “Um Tempo Difícil”, que julgo fazer referência a uma espécie de clubite que afecta as análises políticas neste país. Também interessante o desabafo seguinte, do João, onde se fala de uma suposta “cartilha liberal universal europeia”.
Não resisto a fazer um comentário, inspirado nestes dois posts.
Parece-me evidente que a esquerda e a direita já não existem, ou se existem, estão afastadas do poder, e em todos os países europeus. Manuel Alegre tem discurso claramente de esquerda, assim como Louçã ou Jerónimo de Sousa. Mas estes políticos não têm grande influência; e as facções do PS que poderiam governar à esquerda estão afastadas do poder. Ou seja, este Governo não é de esquerda nem nunca será.
E, no entanto, o Duarte, que tem geralmente boas leitura da realidade, escreve que “são todos de esquerda”, até os de direita agora o são. No fundo, “eles” estão a ganhar por 3 a 0.
Reagindo a estas afirmações, João Távora parece atribuir o fenómeno à cartilha liberal europeia. O liberalismo costuma estar associado à direita, mas aqui surge asssociado à esquerda.
Tenho dúvidas de que a “cartilha universal europeia”, a existir, tenha alguma relação com o liberalismo.
O que me parece factual é que os governos europeus estão cada vez mais parecidos uns com os outros, tirando a gestão de questões internas que variam de país para país. De resto, as famosas reformas estão a ser executadas mais ou menos por todos eles e da mesma maneira. Prodi, supostamente de esquerda, faz o mesmo que Sócrates nas pensões e na administração pública, mas estão ambos a imitar o cristão-democrata holandês Balkenende e o conservador austríaco Schuessel (que perdeu as recentes eleições). O esquerdista Zapatero defende políticas de imigração que lembram as do direitista Sarkozy. Dou estes exemplos para não mencionar os mais óbvios sinais: a admiração da conservadora Merkel pelo esquerdista Blair, ou os programas da direita sueca ou dos conservadores britânicos, com posições sobre alguns assuntos (o aquecimento global, por exemplo) que lembram as do Bloco de Esquerda português. Ou as de Ségolène Royal, que lembram o direitista Blair, o tal que gosta de Bush.
A convergência europeia não acontece apenas na economia, mas também na política.
É por tudo isto que estranho os desabafos do Duarte e do João. Não foi a esquerda quem tomou o poder em Portugal, foi o Bloco Central, que nunca deixou de o ter.
Portugal não tem divisões entre esquerda e direita, tem divisões clubísticas, PS ou PSD, Sporting e Benfica. O primeiro clube está na mó de cima, o segundo na mó de baixo, mas toda a gente sabe que para o ano, há mais campeonato, que em certos anos se ganha, em outros se perde. Entretanto, gasta-se imensa tinta a discutir quem vai para o banco, que treinadores saltam, que árbitros mudam...