Algumas reflexões (para desenvolver mais tarde)
Num dos geniais contos de Anton Tchékhov, O Monge Negro, existe uma passagem que me parece servir para uma breve reflexão. A personagem principal do conto, um filósofo, tem alucinações, durante as quais conversa com um monge cuja imagem é reflexo de miragens sucessivas que atravessaram o espaço e o tempo, ao longo de mil anos. Numa dessas visões, o filósofo pergunta ao monge se ele existe; e o espectro responde: “Existo na tua imaginação, e a tua imaginação faz parte da natureza, logo, existo também na natureza”.
Este conto é sobre a busca da felicidade, mas penso que a resposta do monge nos dá pistas sobre a realidade cada vez mais complexa que nos rodeia, onde se torna difícil perceber até que ponto as pessoas e as coisas são feitas de delírios e construções imaginárias.
A arte é reflexão sobre essa realidade estranha que nos envolve, e cuja incerteza se tornou cada vez mais difícil de captar. Mas a arte (e aquilo que a literatura conta) constitui igualmente um exercício de imaginação e esta última, tal como diz o monge negro, faz parte da natureza, é pois também real, existente e concreta.
Uma narrativa sem imaginação seria apenas reportagem, mas o facto é que esta também envolve um ponto de vista individual e, portanto, uma imaginação. Enfim, aparentemente, só haverá graus de utilização da fantasia e da realidade, que na visão do artista são exactamente a mesma coisa.
O que nos conduz a uma conclusão: o “realismo” não existe, assim como não existe o seu contrário.
nota: tenho lido no Corta-Fitas comentários de leitores que me parecem ser criticáveis atitudes de desprezo pela escritora Margarida Rebelo Pinto. Acho que nenhum artista merece certos comentários e lamento que eles tenham sido publicados aqui. A arte, pelo trabalho que envolve, merece crítica justa, mas nunca o desprezo.