domingo, outubro 07, 2007

No "Métro" com os nativos

A propósito (ou talvez não) da série de posts do Pedro Correia sobre "Cidades que não esqueci", recordo um texto que escrevi há uns tempos sobre uma aventura, ou melhor, uma feliz façanha em terras distantes. Aliás, quem nunca se viu em apertos, que atire o primeiro post.
"Não sei os outros, não sei se é uma lei universal, mas pelo menos para mim amadurecer foi aprender a comportar-me em viagens de modo progressivamente menos ridículo. Da primeira vez que visitei a tumba de Napoleão pedi "Deux billets, s'il vous plait" e esborrachei a cabeça no plástico da bilheteira. (...)
Mas com o tempo as coisas vão melhorando e, um início de quase-sofisticação cosmopolita lhe pousa sobre os ombros como uma águia blasé. Já não fico vinte minutos em pânico, por exemplo, olhando a máquina que vende bilhetes de metro, enquanto as moedas na palma da minha mão tremem e o nativo atrás de mim na fila amaldiçoa estrangeiros. Desenvolvi uma capacidade inacreditável de saber comprar bilhetes do metro. É um superpoder discreto, digamos, e desenxabido, mas é um superpoder mesmo assim."
"A Waterloo de um cronista brasileiro", Alexandre Soares Silva para um número antigo da Atlântico.
Sei do que fala o Alexandre. Sei muito bem do que fala. Desde aquele grandioso, inesquecível, fantástico momento em que, há já alguns anos, venci destemidamente, com destreza e mestria a diabólica máquina de bilhetes no metro da estação Étoile, tornei-me praticamente uma professional, uma técnica, uma igual a eles, uma nativa. Está a faltar-me a baguette enrolada em papel de jornal e o pivete a Gauloises, mas isso são já meros pormenores. Hei-de recordar-me sempre com orgulho da eficiência com que enfrentei aquela cuspidora de bilhetes desconhecida e de aspecto agressivo e como foram suficientes dois ou três segundos para a dominar. Implacável. Só o português me traíu e não falo da língua, pois mantive-me em silêncio (just in case). Falo de quem me acompanhava, completamentes esmagados com a minha técnica e fascinados com a minha desenvoltura.
A partir daquele momento, daquela prova de fogo, com a aquiescência e aprovação dos índigenas, tornei-me uma verdadeira viajante. Depois disso, andar de taxi sozinha no Cairo, foi como beber um copo de água (ou quase).