Fora de série (5)
A minha infância e adolescência tiveram pouca televisão. Por razões que já não sei precisar, tudo lá fora parecia mais interessante do que estar sentada em frente ao ecran. E foi só com o Fame que ficar em casa a ver televisão passou a ser o plano A.
Ao mesmo tempo que estava viciada na série, sentia-me brutalmente infeliz quando o episódio acabava. Eu queria ser mulata e era só morena. Eu queria dançar em movimentos sintonizados e era disléxica. Eu queria usar perneiras de tricô de corres berrantes por cima de umas leggings, mas o meu guarda-fatos só tinha kilts e calças de ganga bem comportadas. Eu queria que o Leroy olhasse para mim com aqueles olhos doces, mas entre os rapazes que eu conhecia nem um usava tranças. Eu queria ter um sonho que me arrastasse para situações de privação, mas mudava de ideias todos os dias sobre o objectivo final (ainda sou assim, só deixei de usar kilts).
A única coisa que estranhava em Leroy, Danny, Jesse, Chris e Coco era o ingrediente que dava nome à série. Eles queriam dançar, cantar, actuar e tocar mas, mais do que tudo, eles queriam ser famosos. Tanto quanto me lembro, foi a primeira vez que a fama surgiu em televisão como um objectivo final, para o qual se tinha que penar. Lembram-se do discurso da professora de dança, que interrompia o genérico? "Vocês querem ser famosos, mas a fama tem um preço. E é aqui, na Escola das Artes, que o começam a pagar. Em suor!". Para quê? Nunca percebi.
Tinha pensado procurar alguns elementos factuais para este texto, mas tive receio de esbarrar em informações sobre como estão os miúdos do Fame na actualidade. Prefiro não saber. "I want to live forever!"
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