domingo, agosto 05, 2007

Cinema Nostalgia (3)


Sempre me intrigou o fascínio que me despertou aquele filme, já que foi um filme do qual eu não percebi quase nada. Tempos antes tinha lido no jornal que era uma obra de arte, imperdível. O nome do realizador, invocado com óbvia deferência, já me era vagamente familiar, de modo que quis, assim que a oportunidade surgiu, partilhar daquela comunhão, antecipadamente rendida à excelência do mestre.
Não, aos 13 anos, não recomendo a ninguém Lágrimas e Suspiros, por ser demasiado arriscado. De facto, eu podia ter-me incompatibilizado com Ingmar Bergman logo ali - era esse o risco - mas estranhamente deixei-me encantar por aqueles planos devoradores de almas, pelos silêncios mais eloquentes a que alguma vez tinha assistido, por aquela quase pornografia onde a nudez era a das angústias e paixões.
Se há coisa de que os adolescentes entendem é de emoções em estado puro. Penso que foi por essa via que um dos filmes mais densos e tristes de Bergman me enlaçou. Para além das palavras a que eu ainda não conseguia chegar, subsistiram aquelas dores que eu reconhecia tão bem e que até ao momento nunca tinha visto assim, magnificamente estampadas em ecrã gigante. A verdade é que nunca mais falhei um Bergman. A Fonte da Virgem, O Sétimo Selo, Morangos Silvestres, Cenas da Vida Conjugal, Face a Face e o tão incompreendido pela crítica O Ovo da Serpente são os títulos de algumas das muitas missas a que passei a assistir, sempre com uma admiração renovada.
Através de Bergman conheci também uma das maiores actrizes do nosso tempo, a norueguesa Liv Ullman, tão presente na sua obra que passou a ser o rosto feminino que imediatamente lhe associamos. Em 2003 foi possível revê-la em Saraband, o último filme de Bergman, uma despedida que não defraudou as nossas expectativas, mas que sem ela não teria sido perfeita.
Há dias, morreu o mestre do cinema que primeiro amei. A ele devo alguns dos momentos mais intensos da minha vida de cinéfila.