O jornalismo que sobrevive às modas
Acabo de adquirir na Feira do Livro Retratos Falados, do saudoso Fernando Assis Pacheco. Abro-o ao acaso – surge-me uma entrevista com António Lopes Ribeiro, publicada em 1988 no semanário O Jornal. Leio as primeiras linhas e só páro quando chego ao fim da saborosa conversa entre o grande jornalista e o quase lendário vulto do cinema português, que realizou O Pai Tirano e produziu Aniki-Bóbó. Anda agora por aí uma polémica sobre o alegado fim das entrevistas como género jornalístico. Puro disparate. Basta ler este volume da Asa (custou-me cinco euros na feira) para se perceber bem que a sobrevivência do género depende apenas de um factor: o talento do jornalista. Assis Pacheco, que foi também um notável escritor, tinha talento de sobra: transformava qualquer entrevista numa disciplina maior do jornalismo. Nada a ver com a prosa uniforme, cinzenta e chocha que descortinamos em boa parte do jornalismo actual, em que cada texto se parece com os outros todos, como se os jornalistas de hoje disputassem entre si um absurdo concurso para ver qual deles publica a prosa mais asséptica e mais insípida. Assis, sem desvirtuar as regras básicas do ofício, punha em cada prosa que assinava a sua marca de autor. Inconfundível. Este é o jornalismo que sobrevive a todas as modas, a todas as eras, a todas as crises. O outro continua a servir para o que sempre serviu: é excelente para forrar caixotes.