quinta-feira, março 29, 2007

Nos 50 anos da RTP (14)


A minha mais remota memória da televisão, ainda a preto e branco, é povoada por séries do velho Oeste. Séries de cobóis, como lhes chamávamos na época – ainda o termo western estava pouco vulgarizado entre os espectadores comuns. Já aqui falei de Bonanza, a minha preferida. Mas houve várias outras. Guardo delas recordações difusas, mas retenho relances do encantamento com que as via, tarde fora, nessa suave aprendizagem do mundo através do ecrã mágico da televisão. Séries como O MAIORAL (NBC, 1962-71), SHENANDOAH (ABC, 1965-66), OS MONROE (ABC, 1966-67) e HIGH CHAPARRAL (NBC, 1967-71). Que me apresentaram o herói solitário, montado num cavalo em direcção ao infinito. O herói imperfeito, muitas vezes zangado com a vida, mas sempre capaz de um gesto solidário, de um acto de abnegação. Havia então uma fronteira nítida entre maus e bons. Nada pode estar mais fora de moda em tempos de vale-tudo. Talvez por isso sinta ainda mais nostalgia destes séries simples – retratos de uma época sem lei mas em que havia uma justiça imanente e a ética não dependia das cotações da bolsa ou das manchetes matutinas. Quando me lembro delas logo recordo os versos de Shenandoah, uma das mais belas canções de sempre: “Oh, Shenandoah, I love your daughter, / Away, you rolling river! / For her I've crossed the stormy water, / Away, I'm bound away, / 'Cross the wide Missouri.”
E sinto-me eu também a cruzar o Missouri. A sulcar oceanos, a galgar montanhas, a galopar nas pradarias. Novamente como uma criança capaz de todos os sonhos.