quarta-feira, março 28, 2007

Um sinistro mundo de sombras (1)


Ando a ler com muito interesse as memórias de Albert Speer, o arquitecto preferido de Hitler que se tornou ministro alemão do Armamento e foi condenado a 20 anos de prisão no Tribunal de Nuremberga. O III Reich por Dentro (edição portuguesa Livros do Brasil), o livro que escreveu enquanto esteve encarcerado em Spandau, dá-nos um retrato minucioso de um dos mais despóticos regimes de todos os tempos – um regime que vivia amarrado à vontade tirânica de um só homem, que subiu ao poder pelo voto democrático e logo suprimiu a democracia, mergulhando a Europa na mais sangrenta carnificina. Speer, que chegou a ser o virtual delfim do ditador, sentiu-se fascinado pelo poder hipnótico de Hitler. Mas, segundo revela, o fascínio deu lugar ao ódio à medida que ia conhecendo cada vez mais em pormenor os meandros do nazismo nos dramáticos meses finais, quando o ditador, entrincheirado no bunker, sem contactos com o exterior, procurava gerir a guerra consultando os mapas que conservava no gabinete e mandava avançar divisões que já tinham sido dizimadas. Speer dá-nos o testemunho de uma camarilha demente, afogada em ódios fratricidas, movendo-se por mero instinto criminoso, já sem qualquer vínculo com o povo que lhes dera o voto inicial, prontamente espezinhado. Um sinistro mundo de sombras de que felizmente nos chegou este relato em primeira mão. Para que nunca mais ninguém se iluda. Para que nunca mais ninguém se esqueça.