A ditadura da maioria
Mário Soares teorizou há uns anos contra a "ditadura da maioria". Na altura, foi incompreendido em vários sectores - a expressão "ditadura da maioria" parecia contrariar a própria essência do espírito democrático. Percebe-se agora melhor o alcance desta expressão: um partido com maioria absoluta na Assembleia da República tende a "absolutizar" o seu comportamento político, subalternizando as restantes correntes de opinião e contrariando a autonomia estratégica da sua própria bancada parlamentar. Viu-se com o PSD, na primeira metade dos anos 90. Isso não sucedeu por acaso: a história repete-se agora com o PS. É um ponto em comum entre ambos.
Nos primeiros meses da sua governação, José Sócrates agiu com extrema cautela neste domínio. Dir-se-ia que o facto de ter um Presidente da República da mesma cor política lhe conferia responsabilidade acrescida no estrito cumprimento das regras do debate democrático. A chegada de Cavaco Silva a Belém, paradoxalmente ou talvez não, libertou o primeiro-ministro de alguns constrangimentos. Só isto explica o claro desprezo pelos mais elementares direitos da oposição que constituiu o veto governamental à audição parlamentar do ex-presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE). A oposição pretendia - e bem - ouvir do próprio Vasconcelos a explicação dos motivos que o levaram a bater com a porta. Havendo fortes suspeitas de que o Governo desrespeitou a autonomia da ERSE, que só "regula" os serviços energéticos se para tanto receber o prévio aval do Conselho de Ministros.
O despacho do ministro da Economia, Manuel Pinho, inviabilizando a audição parlamentar a Jorge Vasconcelos é uma lamentável demonstração da arrogância desta maioria. E um erro tão grosseiro que só consigo interpretá-lo numa estratégia adoptada pelo próprio Sócrates de "cozer " Pinho em lume brando antes de o empurrar para fora do Governo (como se verá em breve). O veto a Vasconcelos, como escreveu André Macedo no Diário Económico, "só reflecte a enorme insegurança política do ministro ", que "não se dá bem com a independência dos reguladores ".
Mário Soares, com o talento que sempre teve para adoptar fórmulas simples e certeiras, chamar-lhe-ia noutros tempos "ditadura da maioria". Pena que ande agora tão calado.
Nos primeiros meses da sua governação, José Sócrates agiu com extrema cautela neste domínio. Dir-se-ia que o facto de ter um Presidente da República da mesma cor política lhe conferia responsabilidade acrescida no estrito cumprimento das regras do debate democrático. A chegada de Cavaco Silva a Belém, paradoxalmente ou talvez não, libertou o primeiro-ministro de alguns constrangimentos. Só isto explica o claro desprezo pelos mais elementares direitos da oposição que constituiu o veto governamental à audição parlamentar do ex-presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE). A oposição pretendia - e bem - ouvir do próprio Vasconcelos a explicação dos motivos que o levaram a bater com a porta. Havendo fortes suspeitas de que o Governo desrespeitou a autonomia da ERSE, que só "regula" os serviços energéticos se para tanto receber o prévio aval do Conselho de Ministros.
O despacho do ministro da Economia, Manuel Pinho, inviabilizando a audição parlamentar a Jorge Vasconcelos é uma lamentável demonstração da arrogância desta maioria. E um erro tão grosseiro que só consigo interpretá-lo numa estratégia adoptada pelo próprio Sócrates de "cozer " Pinho em lume brando antes de o empurrar para fora do Governo (como se verá em breve). O veto a Vasconcelos, como escreveu André Macedo no Diário Económico, "só reflecte a enorme insegurança política do ministro ", que "não se dá bem com a independência dos reguladores ".
Mário Soares, com o talento que sempre teve para adoptar fórmulas simples e certeiras, chamar-lhe-ia noutros tempos "ditadura da maioria". Pena que ande agora tão calado.