segunda-feira, novembro 13, 2006

Keith Jarrett: magia à solta

Acabei de ouvir um dos três melhores pianistas de jazz de todos os tempos no Grande Auditório do Centro Cultural de Belém. Refiro-me a Keith Jarrett (os outros dois são Bill Evans, falecido há vários anos, e o já octogenário Oscar Peterson, que muito dificilmente actuará em Portugal), acompanhado por Gary Peacock no violoncelo e Jack DeJohnette na bateria. Um espectáculo memorável, que empolgou o público heterogéneo que enchia a sala. Vi na plateia músicos como Pedro Abrunhosa, Mário Laginha, João Gil e João Pedro Pais, políticos como Pires de Lima e Durão Barroso (este muito discreto, sem gravata nem segurança, acompanhado do filho mais novo), e ainda Fátima Lopes (a estilista, não a apresentadora da SIC), Miguel Lobo Antunes, António Mega Ferreira e o arquitecto Manuel Salgado, entre muitas outras pessoas.
Felizmente, os célebres ataques de tosse muito à portuguesa quase primaram pela ausência, o que se deveu a uma expressa advertência inicial da organização nesse sentido. Pudemos assim escutar melhor o fabuloso som de Jarrett, que faz tudo quanto quer com um piano. Começou por atacar os acordes iniciais de Tonight, de West Side Story, e acabou - já nos encores - com When I Fall In Love, inesquecível standard popularizado nos anos 50 por Nat King Cole.
É quase lendário o currículo destes homens. Jack DeJohnette tocou com Stan Getz, John Coltrane, Bill Evans e Thelonious Monk. Em 1968, gravou com Miles Davis um dos álbuns fundamentais da história do jazz: Bitches Brew. Gary Peacock também actuou com Evans e Davis - e toda uma vasta constelação de estrelas, incluindo Sonny Rollins, Chick Corea, Helen Merrill e Sarah Vaughn. Keith Jarrett tem a dupla faceta de ser um génio do jazz e um virtuoso do piano clássico, distinguindo-se como intérprete de Bach, Mozart e Chostakovich. O seu Concerto de Colónia é um dos grandes títulos discográficos dos anos 70.
Mas o disco dele de que mais gosto chama-se The Melody at Night, With You. Ouço-o neste instante, noite fora: pura magia à solta em forma de som, como se o tempo e o espaço não tivessem fim.