Democracia sem regras democráticas
A manutenção do princípio do "centralismo democrático (que de democrático só tem o nome) no PCP, ao abrigo do qual o partido se sente no direito de defenestrar qualquer militante que desempenhe funções para que foi eleito pelo voto dos cidadãos, suscita um problema de fundo no sistema político português. Pode um partido com representação parlamentar, num regime democrático como o nosso, ter regras internas de funcionamento manifestamente antidemocráticas? A meu ver não. É nisto que me distancio das opiniões de bloguistas que muito prezo, como Coutinho Ribeiro, expressas a propósito da retirada parcial da confiança política do PCP à deputada Luísa Mesquita (retirada "parcial", note-se, que constitui um monumento de cinismo difícil de igualar). Limito-me a seguir a linha que está inscrita na Constituição da República, que aliás estabelece com toda a clareza que um deputado "representa a Nação" e não um qualquer directório de um partido político. "Estas coisas são demasiado sérias para que brinquemos com elas", como disse ontem Luísa Mesquita ao ser confrontada com a "ordem de despejo" decretada arbitrariamente pelo partido, que neste caso se assume como uma espécie de entidade patronal, capaz de impor despedimentos sem justa causa, à revelia dos procedimentos existentes em qualquer outro organismo da sociedade civil. Queremos uma democracia com partidos que funcionem sem regras democráticas - incluindo conselhos de jurisdição que sirvam de instâncias internas de apelação para os militantes que se sintam injustiçados? Não hesito em dizer que não. Mas o debate fica aberto desde já.