Lisboa numa manhã de Maio (crónica)
Hoje pela manhã, com a família, descemos em passeio a pé a Avenida da Liberdade rumo à Igreja de S. Domingos. Um privilégio de quem trabalha nestas paragens, que considero das mais bonitas de Lisboa. Os meus avós moraram aqui, quase em frente, no 232, no prédio onde mais tarde se instalaram o “Se7e”, o “O Jornal”, e de onde hoje espreitam as memórias mais felizes da minha infância.
A manhã estava radiante e, passeio a baixo, os verdejantes plátanos - que este ano andam histéricos - choviam desesperados os seu pólenes ao vento. Guiado pela paisagem, aproveitando a “galeria” de estátuas, edifícios e monumentos que percorremos, tento explicar aos miúdos a corrente de História e de vidas ancestrais que vêm dar a nós. Que somos parte dum todo.
Entramos pela Rua de Sta. Marta, com as suas modestas casas e mansardas de “gelosias” corridas. Com os seus “lugares”, mercearias e preguiçosos sapateiros; talhos e tabernas, rua que dava vida e serventia aos opulentos prédios da rasgada Avenida liberal e burguesa.
No Largo da Anunciada, ao lado da Igreja de S. José, um prédio finalmente recuperado sempre vai dar em mais um hotel… bom para a concorrência?! Pelo menos está restaurado ao fim de vários anos de intermináveis obras. Continuamos a descer e, recuando na História, chegamos aos Restauradores. Ironia dos tempos, a rapaziada entusiasma-se com a “parada” das vacas coloridas que, espampanantes, atraem as objectivas das câmaras dos turistas felizes. Estes, em conjunto com os africanos e demais imigrantes, são nos dias que passam os "indígenas" destas paragens... Que ambiente! E que bonita cidade afinal partilhamos.
Do Rossio explico aos miúdos algumas épocas que vislumbramos. O D. Maria do Garrett, o altivo Convento do Carmo… e não podemos ir mais longe, que se faz tarde para o nosso objectivo primeiro!
Chegados à Igreja de S. Domingos, o órgão toca música barroca. Esta Igreja, com origem num mosteiro dominicano fundado no reinado de D. Sancho II, impressiona-me pela sua carga histórica. Percorremos o corredor central e… percorremos centenas de anos de História, de celebrações, tragédias e contradições. Dos homens. Da nossa Igreja e da nossa cidade. De um povo caminhante, quantas vezes errante.
Parece-me que todos captamos a mensagem que aquelas paredes de pedra queimada nos contam.
Do meu lugar, cá em baixo, "lembrei-O" da minha família e amigos. Sem esquecer o meu País. Que sempre haja caminho… E que a História nunca acabe, afinal.