quarta-feira, agosto 08, 2007

Cinema Nostalgia (4)

A primeira vez que senti o verdadeiro impacto de uma presença feminina no ecrã foi com os filmes de Jennifer Jones, minha precoce paixão cinéfila. Não era uma estrela como as outras, das que faziam publicidade ao sabonete Lux mergulhadas em banheiras cheias de espuma. Jennifer cheirava a flores campestres: era muito morena, cabelos lisos, lábios cheios, uns olhos enigmáticos que me prenderam (ou me perderam) para sempre. Jennifer, a minha primeira actriz: aparição fulgurante como vidente de Lourdes n' A Canção de Bernadette. Mas nada havia de angelical nela: tinha uma sensualidade explosiva, como fui testemunhando de filme para filme, cada vez mais fascinado pela sua beleza exótica que deixava em brasa todos os homens com quem contracenava: Charlton Heston, em A Fúria do Desejo; William Holden, n’A Colina da Saudade, Gregory Peck, nesse fabuloso Duelo ao Sol; até o errático Montgomery Clift em Stazione Termini, de Vittorio de Sica, talvez a película mais atípica da sua carreira. Quem só descobriu o erotismo na Sétima Arte no momento em que Sharon Stone descruzou as pernas nem imagina do que falo...
Mas nunca ela me seduziu tanto como no mais intangível dos papéis que criou: n’ O Retrato de Jennie, de William Dieterle – perfil recortado no nevoeiro, fazendo acelerar a pulsação de Joseph Cotten. E a minha, rendida de vez ao seu encanto hipnótico.
Não há amor como o primeiro: prendi-me a outras mulheres, perdi-me por outras actrizes, mas nenhuma me fez esquecer Jennifer Jones. Nem os planos rodados no Central Park envolto em névoa desse filme onírico que nunca mais revi. Pergunto-me o que será feito dela: vislumbrei-a pela última vez dançando com Fred Astaire n’ A Torre do Inferno, mas ela parecia já não estar ali, parecia já não ser deste mundo. Senti-me como Joseph Cotten, enquanto do recanto mais fundo da memória emergiam trechos do belíssimo tema de Dimitri Tiomkin, inspirado em Debussy: “With a portrait of Jennie / I will never part / For there isn’t / Any portrait of Jennie / Except in my heart.”
A primeira actriz por quem me apaixonei há-de ser um eterno enigma para mim.