A paixão messiânica do PSD
Caro Duarte Calvão,
O seu último texto e os comentários que suscitou deixaram-me apreensiva. Haverá razões para tanto desânimo? Eu acho que não. O PSD sempre teve uma paixão pelo messianismo, encantadora mas pouco eficaz. Talvez seja a marca de Sá Carneiro. Cavaco Silva, com o mito inaugural de ter ido ao congresso da Figueira da Foz fazer a rodagem do Citroen, alimenta esse romantismo. Calhou-lhe ter o carisma e a oportunidade, mas isso nem sempre acontece. Veja-se o caso de Santana Lopes, que teve os dois, mas não ao mesmo tempo.
Fora das épocas de graça, são os aparelhos que sustentam os partidos de poder. Não percebo, por isso, esse horror ao aparelho. Cavaco Silva, por exemplo, nunca rompeu com o aparelho, e há mesmo quem diga que, por tê-lo deixado crescer demais, acabou devorado, no último mandato. A Sócrates, o poder caiu nas mãos, quase sem lhe dar tempo de se desgastar a conduzir um partido na oposição. Algumas figuras do PSD tentaram construir uma aura messiânica, mas nunca chegam à oportunidade. Recordo António Borges que, a certa altura, até foi notícia de primeira página no Expresso pelo voo que nunca chegou a apanhar no 11 de Setembro...
Os aparelhos fazem falta para as travessias do deserto. Descanse que, quando o PSD voltar a ser governo - e isso vai acontecer, é fatal - os bons vão aparecer. Até lá, o melhor líder é o que existe - qualquer que seja - mais do que os que optaram por ficar no sofá. Há outra forma?