Longe de Lisboa (2)
Já tinha saudades de ver os plátanos, as olaias e o par de araucárias do jardim do Largo Dr. Jorge Correia. Volto aqui nove meses depois: o mesmo cenário deslumbrante, no ponto mais alto de Tavira, paredes meias com o castelo. A dois passos, a convidativa pousada do Convento da Graça, com a sua elegância intemporal. Os sinos assinalam a lenta progressão das horas nas igrejas em redor. Um melro vadio bebe num dos recantos do jardim, regado pouco antes. Crepúsculo sobre a cidade: vejo-a cá do alto, na sua espantosa alquimia de tons, banhada pela despedida dos raios solares.
A Ver Tavira - é o nome do restaurante. Nenhum outro seria mais ajustado para este jantar, dada a sua privilegiada localização. Provo carpaccio de salmão com azeite balsâmico, lulinhas à algarvia, courgettes com queijo de cabra. Há-de vir ainda para a mesa um bacalhau verde com gambas que promete nota igualmente muito elevada. Quem disse que a gastronomia regional se resume a lugares-comuns? E bebo um fabuloso rosé alentejano - Vinha da Defesa, da herdade do Esporão - bem apropriado aos petiscos e à temperatura ambiente. Num país onde a toda a hora se consomem "sangrias" mais que duvidosas e toda a sorte de caipirinhas à refeição, percebo mal esta aversão dos portugueses aos nossos excelentes rosés, que já figuram entre os melhores da Europa.
Volta a soar um sino. E o melro cantou há pouco, reconfortado. Escuto-o: diz-me que é bom estar aqui de férias. Um brinde a esta ave tão sábia: não posso estar mais de acordo.