Os modernistas e o jornalismo patriótico (crónica)
O Nuno tinha aqui um post anterior, a zurzir na ideia do patriotismo no jornalismo. Claro que, teoricamente, concordo com ele: um jornalista não tem nada que estar a definir o que é ou não patriótico. Mas, depois, somos humanos. Quando a GNR parte, sentimos qualquer coisa, chamem-lhe pátria; confesso que isso me acontece menos com a selecção nacional, mas também um bocadinho. Reparem, não acredito em notícias patrióticas, pois o nosso dever é relatar aquilo que achamos ser a verdade. O problema é que geralmente não sabemos o que isso seja.
A minha ideia, antes de iniciar esta digressão, era mencionar aqui a exposição de pintura muito interessante que está patente no átrio do edifício do Diário de Notícias, em Lisboa. É o jornal onde eu trabalho, portanto este é um post contaminado de orgulho patriótico. Os quadros são pouco vistos, dos anos 30 e 40, de autores modernistas e da colecção do Centro de Arte Moderna. Ele demonstram que no Portugal dessa época havia um movimento artístico com grande vitalidade. Enfim, é uma exposição a não perder, num espaço incrível, o átrio do DN, dominado pelos magníficos painéis de Almada Negreiros.
Quando pela primeira vez entrei neste edifício, jornalista acidental, ensinaram-me que uma das regras básicas era o distanciamento, ou seja, quem relata tenta distanciar-se do motivo. Por um lado, aproxima-se, para saber mais, por outro lado não se envolve.
Como todas as boas regras, esta é para ser desrespeitada de vez em quando, como nesta crónica, ou neste desabafo.
Numa ocasião, tive de fazer um trabalho baseado em textos antigos, publicados aqui no DN. Fiquei apaixonado pelo arquivo, pela História deste jornal. Pelas histórias que se perdem, à medida que o tempo passa. E tive uma sensação bizarra, como se aqueles repórteres de 1917 ou de 1946 ou de 1968 tivessem escrito para mim, só para mim, que os lia tantos anos depois. Sei lá, entre outras coisas, lembro-me de uma prosa sobre os marinheiros que tinham sido salvos de um naufrágio, talvez em 1942 ou 43, depois do navio português (neutral) ter sido torpedeado por um “submarino de uma nação não identificada”. Era alemão, claro, toda a gente o sabia, mas por razões patrióticas a nacionalidade não podia ser referida. E não foi. Alguns dos pintores desta exposição também devem ter lido a história dos marinheiros naufragados. E também se emocionaram com ela.
Nota: a imagem é de um quadro de Almada Negreiros e não consta da exposição